Enquanto Tite, Neymar e companhia estão no Catar, outra seleção brasileira terá sua própria Copa do Mundo pela frente nos próximos dias (e jogando em casa). A partir da próxima segunda-feira (5), o Parque Olímpico da Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio de Janeiro, sedia o Campeonato Mundial de bocha paralímpica, modalidade praticada por atletas com deficiências físico-motoras severas. O evento será transmitido pelo canal da Associação Nacional de Desportos para Deficientes (Ande) no YouTube, ao vivo.
A competição reunirá mais de 170 jogadores, de 40 países, além do Brasil. Trata-se do principal evento da bocha no ciclo paralímpico dos Jogos de Paris (França), além de ser o primeiro Mundial com a divisão de atletas por gênero nas disputas individuais, mudança que entrou em vigor após a Paralimpíada de Tóquio (Japão).
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Até 2021, a separação se dava somente pelas categorias funcionais, que são quatro. As classes BC1 e a BC2 reúnem atletas que jogam com as mãos ou com os pés. A diferença é que na BC1 é permitido que um auxiliar entregue as bolas. Na BC3 os jogadores têm o apoio de uma calha para direcionar os arremessos, podendo usar instrumentos para empurrar a esfera. Na BC4, por fim, estão os competidores com lesão medular.
“A expectativa é conquistarmos cinco medalhas, sendo duas de final [ouro ou prata]. É a única competição no período [entre as Paralimpíadas de Tóquio e Paris] na qual estarão todos os melhores do mundo, então [o Mundial] será um balizador, um parâmetro para o que acontecerá em 2024”, afirmou o diretor técnico da Ande, Leonardo Baideck, por meio da assessoria de imprensa da entidade.
O Brasil terá 11 atletas no Mundial, competindo nas quatro classes, sendo que em três delas estará presente nos dois naipes. A exceção é a BC2, na qual o país não será representado entre as mulheres. A BC3, por sua vez, é a categoria com mais jogadores: Evani Calado e Evelyn Oliveira no feminino, Antonio Leme e Mateus Carvalho no masculino.
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A seleção brasileira quer retornar ao topo do pódio do evento, que não ocupa desde a edição de Lisboa (Portugal), em 2010. Na ocasião, Dirceu Pinto (falecido há dois anos e homenageado pelo mascote do Mundial, chamado Dibu) foi campeão individual na BC4 e integrou a equipe vencedora nas disputas em pares da classe ao lado de Adriano Andrade Silva e Eliseu dos Santos. Foram as únicas vezes nas quais o Brasil conquistou medalhas de ouro na competição.
Eliseu, aliás, é um dos veteranos da convocação brasileira, que tem Maciel Santos como mais experiente, a caminho da sétima participação. Campeão paralímpico da BC2 nos Jogos de Londres (Reino Unido), em 2012, o atleta foi ao pódio do Mundial duas vezes em Pequim (China), há oito anos. Na ocasião ele levou o bronze no individual e a prata na disputa por equipes que mesclou as classes BC1 e BC2, com José Carlos Chagas, Daniela Falótico e Luiz Carlos.
Renovação em curso
Maciel, de 37 anos e que esteve na primeira vez em que o Mundial ocorreu no Rio, em 2006, chega à edição deste ano como líder do ranking mundial da BC2 entre os homens e terá um jovem brasileiro como um dos adversários na briga pelo título inédito. Aos 21 anos, dez deles praticando a bocha, Iuri Tauan é um dos estreantes da delegação e passou a representar o Brasil em competições internacionais no ano passado.
“Minha expectativa está a mais alta possível. Espero ir bem no Mundial, representar o Brasil muito bem e levar a medalha para casa”, disse o jovem potiguar à Agência Brasil.
Iuri, inclusive, tem Maciel como referência e chegou a treinar com ele por uma semana em Mogi das Cruzes (SP), onde vive o campeão paralímpico. Juntos, eles foram campeões por equipes BC1 e BC2 na Copa América de bocha realizada no Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo, em dezembro de 2021. Na disputa individual Maciel foi ouro e Iuri levou o bronze.
“Estou levando as competições em que estive com ele [Maciel] como bagagem de experiência. Vou juntar tudo o que aprendi e fazer o máximo para conquistar a medalha de ouro neste Mundial”, projetou o atleta nascido em Parnamirim (RN) e atualmente em 12º lugar no ranking mundial da categoria.
Quem esteve ao lado de Maciel e Iuri na conquista por equipes da Copa América foi Andreza Vitória, outra promessa da bocha. A pernambucana foi diagnosticada, aos dois anos, com a Síndrome de Leigh, doença neurodegenerativa hereditária que atinge o sistema nervoso. Aos 21 anos, ela defende o Brasil desde 2018 e representou o país nos Jogos de Tóquio.
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O Mundial do Rio será o primeiro da carreira da jovem, que chega ao torneio como líder do ranking feminino da BC1. Além dela, somente Maciel, entre os 11 brasileiros, figura no topo de alguma classe. Dos outros nove, quatro estão no top-10: José Carlos Chagas (segundo na BC1), Mateus Carvalho (quinto na BC3), Evelyn Oliveira e Evani Calado (terceira e sexta, respectivamente, na BC4).
“[A liderança] é um conjunto de trabalho de sete anos que vem dando certo. Estou muito orgulhosa dos meus resultados junto com meus técnicos, de ter chegado até essa posição do ranking. Espero fazer uma boa competição e sei que estou preparada para desempenhar o meu melhor”, destacou Andreza, que até 2017 competia na classe BC2, sendo reclassificada à BC1 no ano seguinte, passando a ter o auxílio direto da técnica Poliana Cruz.
Além de parceiros na disputa por equipes BC1 e BC2, Iuri e Andreza encabeçam uma nova geração da modalidade, fomentada desde as Paralimpíadas Escolares. Contando com a dupla, são quatro os atletas brasileiros no Mundial que estiveram no principal torneio para jovens com deficiência em idade escolar. Os outros dois são Letícia Karoline (BC1) e Mateus Carvalho (este último o mais experiente entre eles).
“Qualquer projeto de alto rendimento, por mais bem-sucedido que seja, precisa do olhar voltado à renovação. Estamos trabalhando pensando nos Jogos de Los Angeles [Estados Unidos, em 2028] e, mais para frente, Brisbane [Austrália, em 2032]. Não é porque há medalhistas de ouro [na equipe] que vai esperar o resultado ficar ruim para renovar. Valorizamos muito as Paralimpíadas Escolares, os campings [que reúnem os destaques das Paralimpíadas Escolares], a seleção de jovens, que é um projeto que iniciamos em 2022, [Campeonatos] Brasileiros, Jogos Parapan-Americanos e o Mundial de jovens. Se quisermos permanecer na crista da onda, temos de pensar em um processo de amadurecimento desses atletas”, concluiu Baideck, da Ande.