Ao anunciar a última leva de ministros de seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) oficializou a entrega de três pastas ao União Brasil, partido que nasceu da fusão entre DEM e PSL. Os deputados federais Juscelino Filho (União Brasil-MA) e Daniela Carneiro (União Brasil-RJ) comandarão, respectivamente, as Comunicações e o Turismo. Há, ainda, uma terceira pasta, a da Integração Nacional, liderada pelo ex-governador do Amapá Waldez Goés, que se licenciou do PDT e assumiu o cargo por indicação do ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). O anúncio foi celebrado por aliados de Lula, que viram no movimento uma forma de atrair a sigla, que terá 59 deputados e 13 senadores na próxima legislatura, para a base governista. Depois de um episódio de constrangimento causado por declarações em sentidos contrários dadas pelo deputado federal José Guimarães (PT-CE), que será líder do governo na Câmara dos Deputados, e pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que liderará as articulações no Congresso, sobre a relação da legenda com o governo Lula 3, o que se vê, neste momento, é uma espécie de ameaça ao Palácio do Planalto.
Na tarde desta sexta-feira, 20, o jornal O Estado de S. Paulo revelou um manifesto no qual o União Brasil afirma que não haverá “subserviência” da sigla ao governo Lula. O site da Jovem Pan teve acesso à íntegra do texto. Intitulado “Um Caminho para o Brasil”, o documento diz que “a governabilidade não se dará necessariamente por meio da construção de uma base congressual subserviente”, promete uma posição “firme” em relação ao Executivo e defende o empoderamento do Congresso: “O presidencialismo de coalizão – pai de todas as grandes crises políticas e econômicas recentes – fracassou”, diz trecho do documento. Recado claro. O texto segue e os signatários afirmam que não farão uma oposição “insensata” ao atual governo. “Há, sempre, espaço para o diálogo e o entendimento. Precisamos construir, e não mais segregar”, acrescentam. A prévia do manifesto, segundo apurou a Jovem Pan, tem apoio de caciques renomados da legenda, como os deputados Elmar Nascimento e Mendonça Filho, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, e o ex-prefeito de Salvador ACM Neto. À reportagem, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) disse que o documento é uma versão preliminar do que deve ser apresentado do próximo dia 30. Segundo ele, que também apoia a iniciativa, o objetivo é demonstrar que o partido não é “um balcão de negócios”. “É um partido político, não um balcão de negócios. Queremos fazer um partido que tenha programa, que tenha ideias, que tenha protagonismo no Congresso Nacional. Não queremos colocar calangos para ficar só balançando a cabeça no plenário”, afirmou.
Da mesma forma, o texto também pode ser entendido como um aviso para o próprio presidente da República acerca do descontentamento de parte da legenda, que não se vê representada nos nomes do União Brasil escolhidos para os ministérios. Membros do partido alegam que o processo de escolha dos nomeados aconteceu sem amplo diálogo com os filiados e representam muito mais os anseios de Alcolumbre. “Foram indicados do Davi Alcolumbre, com anuência de algumas lideranças do partido. Mas nenhuma instância partidária participou dessa discussão. Nenhuma convenção foi feita. Ou seja, as indicações explicitamente não revelam o sentimento do partido, só de algumas lideranças”, diz Forte. “A natureza e sentimento de ampla maioria do partido é de independência e liberdade de debate. Não vamos ter apoio incondicional a projeto nenhum. Nunca. A bancada do União é formada por deputados e senadores que merecem e devem ser respeitados, não é uma bancada de calangos”, acrescenta.
“Vai ter unidade em relação a projetos, mas não vai ser 100% governo e nem 100% oposição. O partido sempre dialogou muito internamente, mas normalmente têm posições diversificadas. Vai ter momentos que vai separar, como todo partido, vai liberar a bancada. Não acho que isso prejudique”, afirma o deputado federal Felipe Rigoni (União Brasil-ES), minimizando as possíveis consequências da falta de união da sigla. “Claro que espaço no governo é importante e trará muitos apoios internos do governo, mas tem gente no União Brasil, como o Sergio Moro, entre outros, que são oposição. Então vai ser uma mescla, uma mistura de apoios e oposições”, completa.
O PT acompanha de perto a situação envolvendo o União Brasil, já que uma eventual postura independente do partido – ou até mesmo de oposição, em alguns casos, uma vez que a sigla abriga nomes como Deltan Dallagnol e Sergio Moro, eleitos, respectivamente, para a Câmara e o Senado – deve causar dor de cabeça ao Palácio do Planalto. Sem os votos da nova legenda, a estimativa é que a base de Lula some apoio de 220 deputados e 33 senadores. Para se aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), por exemplo, são necessários 308 votos na Câmara e 49 no Senado. Em outras palavras, o governo terá, neste caso, de negociar, votação a votação, com as bancadas de partidos que prometem fazer oposição a Lula, casos do Partido Liberal (PL), do Progressistas (PP) e do Republicanos, que apoiaram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de outubro. A nova legislatura toma posse no dia 1º de fevereiro. Apesar do otimismo de importantes articuladores do governo, que celebraram a adesão de MDB e PSD, a situação envolvendo o partido presidido por Luciano Bivar indica que o presidente Lula e os ministros do União terão muito trabalho para azeitar a máquina e aparar as arestas de um partido, que, como se vê, não parece ser tão unido.