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Datafolha: Maioria dos brasileiros diz que cor de pele não interfere em relacionamentos

Foto: Adobe Stock

Foto mostra duas pessoas segurando as mãos, uma delas é branca e a outra é negra com a pele retinta 17 de novembro de 2023 | 15:41

Para a maioria dos brasileiros, cor de pele não interfere em relacionamentos amorosos ou de amizade, mas homens e mulheres pretos e pardos são os que mais percebem a influência da raça nas relações. Pesquisa Datafolha inédita dá início à série Afeto em Preto e Branco.

De acordo com o levantamento, 85% dos brasileiros adultos afirmaram que a cor da pele não interfere em relacionamentos amorosos. Para 15%, a raça interfere, e 1% não opinou. Essa percepção é próxima entre homens e mulheres (86% e 84%, respectivamente).

Realizada de 9 a 17 de outubro de 2023, pesquisa tem nível de confiança de 95%, com margem de erro geral de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Quando relacionada com a autodeclaração racial, no entanto, a pesquisa mostra diferenças significativas entre as respostas. Para 33% dos que se declaram pretos, a cor da pele de uma pessoa interfere nos relacionamentos amorosos, ante apenas 13% dos que se declaram pardos e 8% entre os que se declaram brancos. Neste recorte, as margens de erro máximas são de 6, 3 e 4 pontos, respectivamente.

Para Silvane Silva, doutora em história social pela PUC-SP e especialista em relações raciais e de gênero, a discrepância entre pretos, pardos e brancos que veem a cor da pele como fator que influencia as relações diz respeito às vivências de cada grupo.

“Quanto mais a pele é escura, quanto mais contato com a cultura negra e quanto maior a convivência com outras pessoas negras, quando essa pessoa vai para o espaço branco, vai sentir mais”, afirma.

Segundo a pesquisadora, que é autora do prefácio da edição brasileira de “Tudo Sobre o Amor: Novas Perspectivas”, de bell hooks (2021), os pardos transitam entre os dois mundos. “Dependendo do território em que estiver, ele vai ser lido socialmente por algumas pessoas como branco e por outras pessoas como negro.”

Essa alternância poderia explicar a discrepância entre as respostas de pretos e de pardos e brancos, cujos números se aproximam.

A predominância de pessoas brancas entre as que responderam que cor de pele não interfere nas relações pode estar relacionada, segundo Luiza Mandela, mestre em relações étnico-raciais pelo Cefet-RJ, com a falta de consciência racial. “Nós, pessoas negras, sentimos na pele o peso da racialização dessas relações”, diz.

A pesquisa mostra ainda que, entre as mulheres pretas, o total de respostas sobe para 39%, número que cai para 13% entre as mulheres pardas e 9% entre as brancas. Já entre homens pretos, são 26%, frente a 12% dos pardos e 8% dos brancos. Nestes recortes, as margens de erro máximas variam de 4 a 8 pontos para mais ou para menos.

O levantamento tem como base 2.005 entrevistas presenciais, realizadas em 111 municípios. Foram escutadas pessoas de 16 anos ou mais de todas as regiões do país, com diferentes marcadores de gênero, raça, escolaridade, entre outros.

Os participantes da pesquisa Datafolha também foram questionados sobre os próprios relacionamentos amorosos ao longo da vida. Ao todo, 91% declararam que a cor nunca interferiu em suas relações, enquanto 8% disseram que já interferiu.

A parcela que declarou que a cor já interferiu em algum relacionamento amoroso fica acima da média entre homens pretos (19%), seguidos pelos pardos (7%) e depois pelos brancos (5%). O número se repete no caso das mulheres pretas (19%) e pardas (7%), com leve alteração entre as brancas (4%).

Doutor em filosofia e professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Renato Noguera afirma que a diferença de percepção entre homens e mulheres pretos diz respeito à combinação entre o racismo e o machismo, ambos presentes nas estruturas sociais. Ele é autor do livro “Por que Amamos” (2020).

“Para mulheres negras, a interseccionalidade entre racismo e sexismo faz com que, naquilo que a gente chama de um mercado afetivo, as mulheres negras fiquem em desvantagem. E, como é um universo masculino, esse homem tem mais possibilidade de escolha”, afirma.

Noguera diz que isso está associado ao ideal de amor construído na sociedade e retratado nos filmes e romances. De acordo com ele, há uma ideal em torno de quem se deve amar, que passa por uma idealização inconsciente da branquitude.

“Sentimos isso desde o Brasil colônia, quanto tinha um dito popular que dizia: ‘branca para casar, parda para fornicar e preta para trabalhar’. Essa visão racista está presente ainda nas nossas relações amorosas e de convivência”, completa Silvane Silva.

Com relação às amizades, os índices são praticamente os mesmos das relações amorosas. Para 85% do brasileiros, a cor da pele não interfere em relacionamentos de amizade, enquanto para 14% interfere e 1% não opinou. A percepção também varia pouco para homens (86%) e mulheres (85%).

No recorte racial, novamente é observada diferença significativa de acordo com a autodeclaração do participante.

Para 33% das mulheres que se declararam pretas, a cor da pele interfere nas amizades, ante 13% entre as pardas e 7% entre as mulheres que se declaram como brancas. Já no caso dos homens pretos, 26% desse grupo acredita que a cor da pele interfere nas amizades, ante 14% dos homens pardos e 7% dos brancos.

Quando a situação são as amizades ao longo da vida, nove em cada dez brasileiros disseram que a cor de pele nunca interferiu em suas relações de amizade (90%).

A parcela que declarou que a cor já interferiu em alguma amizade é mais alta entre os homens que se declararam como pretos (27%) e as mulheres que se declaram pretas (25%). Depois vêm homens e mulheres pardos (9% em ambos os grupos), seguidos por e homens brancos (5%) e mulheres brancas (4%).

Para Silvane Silva, os números mostram que grande parte da população ainda acredita no mito da democracia racial. “Por mais que a gente já tenha demonstrado, por meio de pesquisas, que as relações raciais no Brasil não são cordiais, grande parte da população ainda tem dificuldade de admitir isso.”

Paola Ferreira Rosa, Folhapress

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