São Paulo — A Justiça de São Paulo determinou que um laboratório deve indenizar um homem após erro em resultado de teste de DNA. Devido ao equívoco, o consultor de vendas, de 36 anos, achou que era pai de uma criança e a registrou em seu nome. Os envolvidos não querem ter seus nomes divulgados.
O consultor de vendas tem união estável com a mãe da criança. No entanto, o casal ficou separado por cerca de três meses em meados de 2020. Durante esse tempo, a mulher se relacionou com outro homem. Na sequência, o casal que já possuía união estável retomou a relação, e logo depois ela descobriu estar grávida.
No quarto mês de gestação, ela decidiu fazer um exame para determinar qual dos dois era o pai biológico. Para isso, contratou a empresa Genomic Engenharia Molecular sob um custo de R$ 4.690 pelo teste de DNA pré-natal.
Foram coletados sangue dela e do homem com quem teve relações fora da união estável, naqueles três meses de separação. A análise apontou que ele não era o pai biológico. Assim, restou a crença de que o homem do relacionamento anterior seria o pai da criança. Os envolvidos, no entanto, não fizeram exame com o material genético dele.
Quando o bebê tinha sete meses, o homem que teve o teste de paternidade negado viu uma foto da criança e a comparou com uma imagem dele quando mais novo. A semelhança entre os dois chamou a atenção.
Por isso, ele e a mãe da criança resolveram realizar um novo teste de DNA, em outro laboratório. O procedimento custou R$ 7 mil e apontou que o homem, do relacionamento fora da união estável, era sim o pai biológico da criança.
A situação, segundo a mulher, deixou o consultor de vendas abalado, pois ele já tinha criado laços com o bebê. Por isso, ele decidiu processar a Genomic Engenharia Molecular.
Os advogados disseram na ação que o homem foi vítima de um evento danoso. “Falta de cuidado. Irresponsabilidade técnica. É um dano bem peculiar, que chamamos de dano reflexo”, disse a advogada especialista em direito civil Vanessa Pinzon, que representa a família, à Folha de S. Paulo.
A defesa do consultor de vendas pediu R$ 80 mil por danos morais. A Justiça concordou com o pagamento da indenização, mas diminuiu o valor para R$ 50 mil. Cabe recurso da decisão.
O que diz a empresa
O site da Genomic Engenharia Molecular estava fora do ar no momento da apuração do caso. O Metrópoles contatou a Ernane Fidelis Gestão Jurídica, escritório que defende o laboratório. A reportagem foi informada que não havia ninguém no escritório, e que alguém entraria em contato por mensagem, o que não foi feito até a publicação deste texto.
No processo, os advogados do laboratório dizem que a Genomic não pode ser responsabilizada “pelo achismo do requerente em reconhecer a paternidade da criança. O ato do seu reconhecimento diz somente sobre as suas atitudes”. O texto afirma ainda que a empresa nunca disse que o consultor de vendas era o pai da criança.
Últimos andamentos do processo
Na réplica à contestação do laboratório, os advogados do homem afirmaram que ele registrou o bebê baseado em um exame negativo, pois a genitora tinha a possibilidade de apenas dois supostos pais.
A família da criança contratou o geneticista forense Eduardo Paradela, que apontou problemas no primeiro exame. “Haviam questionamentos aos peritos do laboratório, quesitos técnicos, especialmente sobre pontos do laudo que não informavam claramente as tiragens, ou seja, perfis genéticos, encontradas”.
“Deve-se observar que o teste, mesmo feito no momento pré-natal, é confiável, desde que todas as fases e critérios de segurança sejam observados. Não se trata de questionar o exame de DNA, que possui valia mais que comprovada, mas sim questionar a forma de realização”, disse Paradela também à Folha.
O caso aconteceu em 2020. A sentença sobre o pagamento saiu em novembro passado, e a decisão em segunda instância foi ratificada no fim de setembro deste ano, após o laboratório apresentar apelação.
“A indenização por dano moral fora razoavelmente arbitrada para a extensão e natureza do dano, sem que se vislumbre fonte de enriquecimento indevida ou excessiva onerosidade, anotando-se que a ré presta serviços especializados de alto valor”, concluiu o desembargador Pedro Baccarat, relator do processo.