Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) requer, com urgência, a suspensão das licenças ambientais e a consequente paralisação das obras e operações de três empresas de energia solar e de um aeródromo, instalados em área reivindicada pela Comunidade Remanescente Quilombola de Barrinha, em Bom Jesus da Lapa, na região do Velho Chico, no interior da Bahia.
A ação foi protocolada na Justiça Federal no dia 3 de outubro. Nela, o MPF requer que os quatro empreendimentos e o município de Bom Jesus da Lapa sejam condenados, solidariamente, ao pagamento de R$ 2 milhões por danos morais coletivos, em favor da comunidade quilombola de Barrinha.
De acordo com o procurador da República Marcos André Carneiro Silva, que assina a ação, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Bom Jesus da Lapa concedeu às empresas Mini Solares do Brasil, Emana Bahia Locação de Equipamentos e Autogeração Solar BJL Barra e ao responsável pelo aeródromo Ninho do Bacurau, licenças ambientais sem a realização de qualquer procedimento de consulta prévia, livre e informada à CRQ de Barrinha, conforme determinado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
As investigações do MPF foram iniciadas após a Associação Quilombola de Barrinha e Lagoa das Piranhas enviar, em 30 de novembro de 2022, representação noticiando a implantação de projeto de energia solar em seu território sem que houvesse a consulta prévia, livre e informada. A licença ambiental para o empreendimento foi concedida, em 2 de dezembro do mesmo ano, pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, com validade de três anos.
O MPF, então, expediu recomendação ao município de Bom Jesus da Lapa para que suspendesse esta e outras eventuais licenças para empreendimentos públicos ou particulares no território ocupado pela comunidade tradicional. O município decidiu por não adotar as medidas apontadas na recomendação, porém, encaminhou documentos referentes a empreendimentos licenciados ou que solicitaram licenciamento no interior da área demarcada para a comunidade quilombola de Barrinha.
A partir da documentação, o MPF identificou as outras duas empresas de geração de energia fotovoltaica e o aeródromo com licenças emitidas sem a realização de qualquer procedimento de consulta prévia, livre e informada às comunidades remanescentes de quilombos localizadas na área de influência dos empreendimentos, e nem de condicionantes que determinassem a realização de tais consultas.
Na ação, o MPF requer, ainda, que:
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as empresas de geração de energia fotovoltaica se abstenham de iniciar ou continuar obras de instalação e operação de empreendimentos na área quilombola, sem que haja a consulta prévia, livre e informada;
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o responsável pelo aeródromo Ninho do Bacurau, instalado na área quilombola, paralise sua operação e não realize novas obras no empreendimento sem que haja a consulta prévia, livre e informada;
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o município de Bom Jesus da Lapa abstenha-se de emitir novas licenças ambientais para realização de obras ou operações que impactem qualquer comunidade quilombola ou povos originários na municipalidade, notadamente à comunidade quilombola de Barrinha, sem que haja o consentimento prévio, livre e informado da respectiva CRQ.
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ao final do processo, seja declarada a nulidade das licenças emitidas em área sobreposta ao território reivindicado pela comunidade quilombola de Barrinha
O QUILOMBO
A Comunidade Remanescente Quilombola de Barrinha é composta, atualmente, por 80 famílias e enfrenta diversos problemas relacionados à perseguição por fazendeiros, usurpação de suas terras, e isolamento social. A situação é agravada pela pressão da exploração turística, dada a proximidade com a sede do município, que mantém parte de suas receitas advindas do turismo religioso.
No decorrer do inquérito, foi apurado que a Superintendência do Patrimônio da União (SPU) na Bahia realizou fiscalização, em 10 de novembro de 2022, a partir da qual expediu relatório em que restou identificada, registrada e demarcada a área requerida pelos quilombolas.
Além disso, a comunidade já foi certificada pela Fundação Cultural Palmares, em julho de 2006, como remanescente das comunidades dos quilombos, e aguarda conclusão de processo administrativo de regularização fundiária de seu território, em tramitação no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desde 2011.