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Mulheres buscam espaço em ambiente masculino do automobilismo

O automobilismo ainda é um esporte majoritariamente masculino. No entanto, nos últimos anos, as mulheres vêm conquistando espaço na modalidade. Os ídolos nacionais, como Ayrton Senna, Emerson Fittipaldi e Rubens Barrichello, estão marcados na história como um espelho. Mas, entre as pilotos, a inspiração também surge a partir de outras mulheres que lutaram por melhorias e quebraram barreiras no paddock e nas pistas.
Pioneira na luta pela presença feminina no automobilismo, Bia Figueiredo pode ser considerada uma das maiores pilotos do Brasil. Atualmente disputando a Copa Truck pela equipe ASG Motorsport, ela foi a primeira brasileira a correr em uma grande categoria do automobilismo mundial, a Fórmula Indy, além de ser a primeira mulher do mundo a vencer na Firestone Indy Lights, a única a vencer na Fórmula Renault, a conquistar uma pole position na Fórmula 3 e a disputar e vencer no Desafio das Estrelas – torneio anual de kart organizado pelo ex-piloto Felipe Massa.
Mas a história feminina no automobilismo não para nos desafios enfrentados por Bia durante toda a carreira. Ela se estende às centenas de meninas que são apaixonadas  e sonham em seguir carreira dentro do esporte a motor. É o caso da piloto Rafaela Ferreira e da engenheira de dados Erika Prado. 
Estreante na Fórmula 4 Brasil – categoria de base licenciada pela Federação Internaconal de  Automobilismo (FIA) – Rafaela Ferreira, de 17 anos, contou ao Superesportes que sonha em vencer o campeonato inspirada pela história da pioneira Bia Figueiredo. 
“Venho treinando muito, decidi focar na Fórmula 4. Entrei na academia, mudei minha alimentação. Minha força está toda nisso. Espero trazer este título para casa. Como mulher, me inspiro muito na Bia Figueiredo. Ela foi uma mulher que quebrou recordes, chegou à Fórmula Indy, não é pra qualquer um”, contou. 
Fora das pistas, a engenheira de dados da equipe Cavaleiro Sports, da F4 Brasil, Erika Prado conta que parte do seu interesse em seguir carreira no automobilismo surgiu após assistir à piloto Bia Figueiredo correndo na Fórmula Indy, no Brasil, em 2012. 
“Em 2012, eu tinha 19 anos e acabei indo à minha primeira corrida de Fórmula Indy, que foi no Sambódromo do Anhembi. Foi a primeira vez que vi a Bia Figueiredo correndo – na época, a piloto corria na Indy. Como é uma categoria de circuito de rua ou de oval, as coisas – boxes, equipamentos, pneus e etc – ficavam na rua, e a gente via um pouco de como funcionava. Eu fiquei encantada com aquilo e sonhei em trabalhar com automobilismo”, comenta Erika. 
Assim como Rafaela e Erika conquistam espaço, outras mulheres trilham histórias parecidas no esporte a motor. 

Mulheres no paddock

Nos últimos anos, houve um aumento significativo no número de mulheres em áreas do esporte que antes eram majoritariamente ocupadas e relacionadas a homens. Torcedoras, jornalistas, comentaristas, profissionais de automobilismo e influenciadoras ligadas ao assunto vem sendo cada vez mais presentes. 
Para Erika Prado, o interesse feminino pelo automobilismo não é novidade, mas a conquista é lenta. 
“As mulheres sempre se interessaram por automobilismo. Sempre estiveram lá. Só que com movimentos como Girls Like Racing (comunidade feminina fundada por ela sobre automobilismo), criadoras de conteúdo feminino e todo o processo de inclusão de mulheres em todos os lugares, acabou chegando até o esporte a motor. Demorou muito”. 
Na Fórmula 1, maior categoria do automobilismo mundial, algumas mulheres já deixaram seus nomes marcados na história, como a italiana Maria Teresa de Filippis, primeira mulher a competir na Fórmula 1. Lella Lombardi, também italiana, obteve o melhor resultado de uma mulher na linha do tempo do esporte. Ou nomes como Divina Galica, Desiré Wilson e Giovanna Amati. 
Apesar de apenas cinco mulheres terem competido na F-1, a presença feminina não se limita a elas. 
“É uma onda que veio pra ficar.  É como eu ouvi em uma entrevista da CEO da Automotive Business (Paula Braga). Ela disse que não é uma fase que vai passar, quem não se adequar, vai estar fora do negócio daqui uns anos. Vejo a aproximação de fãs, de mulheres como profissionais do automobilismo, como algo muito positivo. As mulheres começaram a mostrar quem elas são e do que elas gostam, e isso é um movimento atual, e é maravilhoso”, declarou Erika. 
A presença de competidoras nas categorias para projetos de desenvolvimento e testes de carros da Fórmula 1 aumentou. Além disso, categorias direcionadas ao público feminino também foram criadas, como a W Series e a F-1 Academy. 
No cenário internacional, alguns nomes se destacam dentro e fora das pistas: Jamie Chadwick, tricampeã da W Series e piloto de desenvolvimento da Williams; Susie Wolff, ex-piloto profissional e atualmente diretora administrativa da F-1 Academy; Sophia Floersch, única piloto no grid da Fórmula 3; e Hannah Schmitz, engenheira mecânica e estrategista da equipe Red Bull Racing na F-1. 
Para Rafaela Ferreira, o aumento no número de mulheres no esporte a motor é perceptível.
 
 “Vejo esse aumento das mulheres no automobilismo. Antes, quando ia correr, tinha só eu de mulher. Hoje tem bem mais meninas na pista, mas também por trás, como engenheiros e jornalistas. É muito legal o movimento de mulheres apoiando outras mulheres. Esse movimento a gente não via antes. A Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) está incentivando a gente. Vejo um crescimento, mas ainda é pouco. Tem espaço para mais mulheres”, disse a piloto que estreia na F-4 nesta temporada.
Na categoria de base, Aurélia Nobels se destaca. A primeira mulher a correr na F-4 Brasil, atualmente faz parte da Ferrari Drivers Academy, academia de formação de pilotos da Ferrari, na Itália.
Filha de belgas e com residência no Brasil, Aurélia superou 16 competidoras e se sagrou campeã do “FIA Girls on Track – Rising Star” em 2022, programa da Federação Internacional de Automobilismo (FIA) em parceria com a Ferrari que buscava dar oportunidade para novas pilotos no automobilismo mundial. 
Nesta temporada, Nobels irá disputar a Fórmula 4 Italiana com a Prema Racing. 
No automobilismo brasileiro ainda, destacam-se a piloto da Stock Series Bruna Tomaselli, a piloto Débora Rodrigues da Copa Truck e a engenheira de competição Rachel Loh, da AMattheis Motorsport. 

Preconceito no paddock e nas pistas

Apesar do crescimento do número de mulheres na modalidade e até mesmo fora das pistas, o preconceito ainda existe. Rafaela relata ter sofrido distinção no início da carreira, pelos pais dos colegas que também pilotam.
“Uma vez ganhei uma corrida e cheguei na balança pra me pesar. O pai de um dos meninos falou que era pra eu ser desclassificada, porque tinha alguma coisa errada, não era possível que eu ganhasse do filho dele. E não tinha nada errado, estava tudo certo, eu tinha nove anos. É mostrando na pista que a gente consegue andar com os homens, mostrando os nossos resultados. Adquiri esse respeito deles ao longo do tempo”, falou a piloto.
Já Erika, revelou que ainda é alvo de comentários sexistas e misóginos por ocupar uma posição de prestígio dentro da equipe: “Já cheguei a ouvir absurdos como: ‘você é uma mulher bonita, não precisa ficar aqui no autódromo trabalhando com carro de corrida. Por que não trabalha com outra coisa? Em alguma coisa que você não fique suja, descabelada?’ Ou então falam ‘não sei se isso ia acontecer de qualquer jeito, ou só aconteceu porque você é mulher’. Ainda é difícil estar em um meio cercada quase que 100% por homens”, comenta. 
 
 
A engenharia citou que a resistência para reconhecer uma mulher em um ambiente tão masculino mostra o machismo estrutural ainda presente na sociedade. No entanto, Erika acredita na mudança dentro do esporte.
“Geralmente, o pessoal demora mais pra me respeitar nas equipes. As pessoas não estão acostumadas a lidar com o que elas não conhecem. Tem todo o machismo estrutural, tive que ter muita paciência, muita perseverança, e dar o exemplo de muitas coisas pra ser respeitada no meio. Isso tende a mudar, mas ainda é um caminho muito longo e árduo”, opinou.
O preconceito não acontece apenas com as mulheres que estão nas pistas. Segundo Erika, a imprensa feminina também costuma ser alvo de comportamentos machistas no autódromo. 
“Vira e mexe entra uma menina chorando na garagem da Cavaleiro Sport. A gente sabe que o dia a dia cobrindo o automobilismo é difícil. Tem cara que é machista e babaca. Situações que as meninas ainda não sabem lidar. Já tivemos problema com um cara que estava assediando uma menina que estava trabalhando. Estou aqui para apoiar e ajudar”, revela.  

Projetos para mulheres no automobilismo 

A criação dos projetos serve como base e inspiração para quem está começando no esporte. Para Rafaela, o incentivo dos projetos é importante para que um dia uma mulher possa estar na F-1.
“Meu maior sonho é chegar na Fórmula 1. O mundo quer uma mulher na Fórmula 1, percebemos isso por tantos programas que têm sido criados como a W Series, F-1 Academy e até a FIA Girls On Track. Acho que o mundo precisa de uma mulher lá”
Fora das pistas, as engenheiras brasileiras chamam atenção por estar à frente de projetos voltados à adesão feminina no esporte a motor. Em janeiro deste ano, Rachel Loh foi responsável por desenvolver um curso imersivo sobre automobilismo para mulheres. Com o apoio da equipe AMattheis, a “Imersão motorsport para mulheres” reuniu mais de 500 meninas em 40 horas de curso com diversos palestrantes da área. 
Ao lado de Erika Prado, Rachel Loh também auxilia no desenvolvimento do Girls Like Racing. A comunidade que reúne centenas de meninas fãs de automobilismo tem por objetivo criar um espaço acolhedor para mulheres dentro do esporte a motor e promover projetos de inclusão. 
Visando a integração de mulheres em todas as áreas do automobilismo nacional, a CBA criou neste ano a Comissão Feminina de Automobilismo (CFA). A piloto Bia Figueiredo foi nomeada presidente da organização, enquanto a engenheira Rachel Loh e a publicitária Bruna Frazão fecham a equipe em busca de igualdade no esporte a motor. 
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