O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, ontem (8/6), que o rol de procedimentos listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para a cobertura dos planos de saúde é taxativo. Isso significa que as operadores são obrigadas a cobrir apenas os itens da relação. Especialistas defendem a decisão, argumentando que ela oferece segurança jurídica aos planos, enquanto entidades formadas por usuários dizem que tratamentos estão em risco.
Na prática, o julgamento precisava decidir se o rol deveria ser taxativo, oferecendo e limitando a lista de procedimentos obrigatórios, ou exemplificativo, servindo como uma referência mínima de serviços a serem oferecidos pelos planos de saúde. Por seis votos a três, a 2ª Seção do STJ determinou que o rol é taxativo, mantendo a obrigatoriedade de atendimento para os casos previstos na lista da ANS, mas com critério, abrindo a possibilidade de análise das exceções.
O rol da ANS com mais de 3,7 mil procedimentos vinha sendo considerado exemplificativo pela maior parte de decisões judiciais sobre o tema. Nesse caso, pacientes que tivessem negados procedimentos que não constassem na lista poderiam recorrer à Justiça para ampliar o atendimento. Com o novo entendimento, a lista contém toda a obrigatoriedade que os planos são obrigados a pagar, ou seja, o que não está na lista não precisa ser coberto.
Embora a decisão do STJ não obrigue as demais instâncias da Justiça a seguir esse entendimento, o julgamento serve de orientação em processos que tratem do tema. O rol da ANS compreende todas as doenças previstas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Debate
O STJ chegou à decisão após o julgamento de embargos de divergência em dois recursos especiais envolvendo uma cooperativa médica de Campinas (SP). Neles, o grupo contestava a obrigatoriedade de cobrir o tratamento de uma criança com transtorno do espectro autista. O procedimento em questão não está descrito no rol da ANS.
A decisão foi comemorada pelas entidades que representam as operadoras. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde) apontou como “acertada a decisão do STJ acerca da cobertura dos planos de saúde”, e que o entendimento beneficiaria 49 milhões de usuários. “A ratificação de que o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, da ANS, é taxativo, garante, em primeiro lugar, a segurança do paciente, além da segurança jurídica e da sustentabilidade dos planos de saúde”, diz a nota da entidade.
“A decisão do STJ reconhece que os mecanismos institucionais de atualização do rol são o melhor caminho para a introdução de novas tecnologias no sistema. Hoje, o Brasil tem um dos processos de incorporação de tecnologias mais rápidos do mundo, podendo ser finalizado em quatro meses. Todo este arcabouço regulatório, preservado pela decisão do STJ, garante a sustentabilidade do sistema”, avalia a Fensaúde.
Professor de economia da saúde na Universidade do Rio Grande do Sul (URGS), Giacomo Balbinotto destaca que, embora pareça contraditório, o rol taxativo permite que os planos de saúde tenham maior previsibilidade e o setor deverá se beneficiar da decisão. “A decisão garante segurança jurídica aos planos, o que, do ponto de vista econômico, contribui para a sustentabilidade das carteiras. Nesse aspecto, é uma decisão muito bem-vinda”, diz.
Gustavo Kloh, professor da FGV Direito Rio, disse que admitir uma lista indeterminada de procedimentos acabaria por prejudicar usuários que não demandaram o atendimento especial. “O plano poderia ficar excessivamente caro para todo mundo. Com o rol taxativo, é possível fazer um cálculo mais eficiente (das mensalidades)”, avalia.
Entidades ligadas a usuários, como familiares de pessoas com espectro autista ou doenças raras, lamentaram a derrota. “Doença não se escolhe, muito menos tratamento. Então, se alguém tem um plano de saúde há 20 anos e é surpreendido com alguma doença rara, por exemplo, o plano de saúde não pode atender apenas se for obrigado. O rol taxativo favorece as operadoras, que a ANS não deveria estar protegendo”, disse Renê Patriota, coordenadora executiva da Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistema de Saúde (Aduseps).