Foto: Jane de Araújo/Agência Senado/Arquivo
O senador Jorge Kajuru 22 de março de 2024 | 08:53
Autor da proposta para acabar com a reeleição para prefeitos, governadores e presidente, o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) afirma à Folha que eleição a cada dois anos é uma gastança desnecessária, além de um convite à corrupção.
“No segundo mandato você está preguiçoso, desanimado e, se você for corrupto, mais apetitoso. Mais guloso, cachorro mais faminto. Você vai querer roubar mais porque são seus últimos quatro anos. E vai deixar roubar”, diz o parlamentar.
Apesar dos sinais do Senado de que a pauta deve avançar em 2024, Kajuru afirma que a recepção da Câmara ainda é “imprevisível” —e não poupa críticas aos colegas da Casa vizinha.
Mesmo líder do PSB e vice-líder do governo, Kajuru avalia que hoje deputados federais do chamado “alto clero” têm mais influência que senadores —impressão que tem sido comum nos corredores do Senado e que não esconde a ciumeira de uma Casa com a outra.
“A Câmara todo dia dá a impressão de que o [escritor e humorista] Millôr Fernandes tinha razão: o dinheiro compra o cão, o canil e o abanar do rabo. Não com todos, eu nunca generalizo. Mas ali é jogo. Ali é ministério, é cargo, é dinheiro todo dia.”
Ele diz também: “Hoje deputado federal tem mais valor que senador. Agora, é claro que ele tem que participar do alto clero. Tem que ser um deputado federal de nível, de postura, de credibilidade, com força. Senador, hoje, a força dele é muito menor. O que tem é status. Eu nunca operei uma galinha e tem gente que me chama de doutor”.
A maioria dos brasileiros é contra o fim da reeleição para presidente, governadores e prefeitos. Segundo o Datafolha, 58% do eleitorado quer a manutenção da possibilidade de recondução ao cargo, ante 41% que preferem vê-la proibida. O restante não soube responder.
Kajuru foi um dos convidados para o jantar que Lula (PT) promoveu, no início de março no Palácio da Alvorada, com integrantes da base aliada no Senado. Na ocasião, o petista defendeu o instrumento da reeleição, mas disse que não irá interferir na tramitação da proposta.
“Ele [Lula] falou: ‘Kajuru, eu te conheço há 35 anos e você sabe que a nossa relação sempre foi a melhor possível. Agora, eu discordo de você. Eu acho que a reeleição é importante. São poucos países que não têm. Não vou interferir’. Falou para todos os líderes: vocês decidem. Não se influenciem pela minha opinião’”, disse o senador.
O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já se manifestou de modo favorável ao fim da reeleição, assim como governadores, como Romeu Zema (Novo-MG).
Uma das críticas à PEC em tramitação é a de que ela não aplica o mesmo critério para os mandatos no Legislativo, que pelo texto seguiriam sem limite de renovação. De acordo com o parlamentar, uma proposta nesse sentido no Congresso “perderia feio”.
O senador promete, no entanto, apresentar no futuro dois projetos para tentar dar andamento ao que tiver mais apoio: um que aumenta o mandato de parlamentares, sem reeleição; e outro que prevê a possibilidade de até duas reeleições, mas veta uma terceira.
“Evitaria a profissão. Tem gente que está há 46 anos aqui. Tem gente digna. Álvaro Dias ficou 46 anos aqui, um homem de uma honra intocável. Mas não é todo dia que tem um Álvaro Dias. O cardápio não é bom. O cardápio é péssimo. A maioria, vamos falar a verdade, ficou aqui 30, 35, 40 [anos], ficou bilionária, saiu para nunca mais precisar de dinheiro na vida e roubou mesmo”, afirma.
“Penso até na minha reeleição. Será justo eu querer ser reeleito senador em 2026 se eu propus o fim da reeleição? É discutível isso. A princípio é uma incoerência. Por isso que talvez, se eu continuar, eu decida ser candidato a deputado federal e encerre a minha carreira. Porque eu vou estar com 72 anos e eu quero beijar na boca e ser feliz.”
Kajuru é relator da chamada PEC dos militares, que tenta impedir a entrada de fardados da ativa na política. A PEC foi apresentada em setembro pelo líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), para “garantir a neutralidade política das Forças Armadas”.
O senador admite que integrantes do governo têm buscado um acordo com os militares para atenuar a proposta, mas diz que não vai promover mudanças no seu relatório.
“O relatório é esse, pronto, acabou. Se o governo chegar a um acordo, podem me tirar da relatoria, podem colocar outro. Eu mantenho o meu do mesmo jeito que eu escrevi, não vou mudar.”
Disse ainda: “Está em discussão muito a questão da remuneração [a PEC diz que o militar com menos de 35 anos de serviço deve perder o salário se for candidato]. Pode haver algum acordo. Está se discutindo, está havendo todo dia muita conversa.”
Ele ainda se queixa do ministro José Múcio, da Defesa, por não tê-lo avisado que tratou da PEC com o senador e ex-vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
“O Mourão foi conversar inclusive com o José Múcio. Se for verdade que ele teve essa conversa, o Múcio errou comigo. Ele deveria me comunicar. Eu sou o relator. Fiz um relatório, ele conversa com o Mourão e não me comunica? Você acha isso correto? Eu não gostei. Isso me aborreceu muito. Ele tem uma conversa para fazer acordo com o Mourão e não me comunica? Você está de brincadeira comigo.”
RAIO X
Jorge Kajuru, 63
Jornalista, radialista e apresentador de TV, comandou programas esportivos na RedeTV!, Band e SBT. Foi eleito pela primeira vez em 2016, como vereador de Goiânia. É hoje senador por Goiás, líder do PSB e vice-líder do governo.
Thaísa Oliveira/Folhapress