Os aposentados e pensionistas que pegaram empréstimo consignado ao longo de 2022 precisaram arcar com uma taxa de 2,14% ao mês para quitar as parcelas. Em 2023, mais precisamente no último mês, o cenário mudou. Primeiro, o Conselho Nacional de Previdência Social decidiu pôr um teto na taxa, permitindo que bancos e financeiras cobrem até 1,70% de taxa. Com a ameaça de restrição de crédito por parte das instituições financeiras, o Conselho definiu que a queda dos juros não seria tão grande, fixando-a em 1,97%. A redução, porém, já é suficiente para fazer com que muitos baianos corram aos agentes financeiros atrás de novos consignados, como pretende o aposentado Alberto Moreira, 64 anos. A prática, porém, traz riscos de super endividamento (leia abaixo).
“A notícia é ótima! Já estava pensando em pegar o consignado inclusive para quitar um outro empréstimo pessoal em que os juros estão me matando. Agora é que vou fazer mesmo porque já antecipo o pagamento, reduzo valor e vou lidar com um valor menor para pagar”, afirma ele, que estava esperando apenas a confirmação de que haveria uma redução na taxa.
Para efeito de comparação, a reportagem fez a média dos juros por mês de empréstimo pessoal nos cinco bancos mais populares do país – CAIXA, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander – em março de 2023. A taxa média é de 7,7%.
Advogado especialista em Direito Previdenciário, Isaac Carvalho explica que o consignado é um crédito descontado diretamente na fonte ou no benefício de quem o pega. Por isso, as financeiras e bancos têm mais segurança, sabendo que vão receber os valores. “Porém, instituições disseram que era inviável abrir crédito com 1,70%. Algumas fizeram até um cancelamento da abertura de novos consignados. Com 1,97%, algumas já concordaram em abrir essas linhas de crédito para a categoria”, detalha Isaac.
A concordância das instituições é vista como um benefício por Alberto, que está enrolado nos empréstimos. “Estava pegando um para quitar o outro. No fim, os juros acumulados sempre me derrubavam e eu acabava me complicando. Agora, estou me organizando e querendo sair dessa vida de dívidas. O consignado vai me ajudar a me recuperar sem tanto problema”.
Impacto econômico
Em caso de uso disciplinado da opção, o consignado com juros mais baixos ajuda beneficiários do INSS que estão presos a dívidas ou tiveram despesas extras. Para a economia, porém, especialistas afirmam que a curto prazo é positivo, mas em um futuro mais distante pode haver consequências.
Edísio Freire é economista e mostra preocupação. Segundo ele, crescimento econômico pautado em crédito de forma exclusiva pode ser um problema. “A médio ou longo prazo, pode-se criar uma bolha financeira. As pessoas que hoje tomam crédito, se em algum momento não conseguirem pagar, ficam inadimplentes, deixam de ter acesso ao crédito e de consumir porque estão pagando dívida. Então, a oferta de crédito sem um planejamento financeiro que a ancore é perigosa”, explica.
Ainda assim, Freire destaca que ações de crédito, quando acompanhadas de um plano de crescimento econômico com outras ações que a apoiem, são importantes para os cidadãos, para a máquina pública e até para os próprios bancos pelo volume de beneficiários estimulados pela decisão.
“Reduzir o teto da taxa do consignado é importante e justo. Poderia, na minha opinião, ser inclusive menor, porque o consignado é um crédito que a instituição que oferece tem a garantia de que vai receber esse dinheiro”, conta ele, que entende o impacto como pequeno para os bancos que, apesar de menos juros, tem maior procura por crédito.
Guilherme Dietze, economista da Fecomércio-BA, concorda que a taxa juros em 2,14% ao mês, como estava antes, e até a nova de 1,97%, são altas, mas analisa que não cabe ao governo ações unilaterais. Para ele, mesmo que a taxa de juros esteja elevada e que o consignado seja um empréstimo de baixo risco, não se pode pôr um teto sem negociar com bancos.
“Você pode ter uma medida com um intuito positivo, de estímulo ao crédito mais barato. Porém, se faz isso à força, sem negociação, pode gerar o efeito contrário. Os bancos podem olhar e decidir que a esse custo não fazem. Então, você teria uma redução de oferta de crédito”, analisa.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) reforçou essa possibilidade, discordando da redução na taxa de juros. Para a federação, é preciso haver compatibilidade entre taxa e os custos que os bancos arcam para fornecer o crédito. “Neste momento, considerando os altos custos de captação, a eventual redução do teto poderia comprometer ainda mais a oferta de empréstimo consignado e do cartão de crédito consignado”, escreve em nota.
Fácil agora, difícil depois
A opção pelo crédito com juros menores pode se tornar um problema caso seja usada sem planejamento e de forma indiscriminada. Guilherme Dietze convoca os aposentados e pensionistas a analisarem com cuidado se há ou não a necessidade de optar pelo crédito.
“Vale a pena contrair esse crédito? Tem que se perguntar se precisa desse dinheiro, se tem emergência de saúde, na família, na alimentação ou taxa de juros no cartão que é muito mais elevada. Se sim, pode ser o momento. Pegar só pelo crédito é ruim”, afirma o economista.
É que, quando se pega por apenas ter essa opção, o tomador do empréstimo acaba ficando com menos dinheiro do que deveria, já que arca com juros que são o custo do crédito.
Isaac Carvalho corrobora com o economista e reforça o cuidado que é necessário nessa modalidade de crédito. “É uma linha interessante, de fácil aprovação e com juros menores. Porém, essas vantagens só vão ser efetivas de fato para quem faz a sua programação financeira direitinho. É um crédito que vai ser descontado, não tem como adiar”, alerta.
É importante salientar que a taxa de juros do INSS de 1.97% ao mês gera um acumulado anual de 27,4%. Essa é a taxa válida apenas para aposentados e pensionistas. Outras categorias como servidores públicos (24,5%) e trabalhadores do setor privado (39,6%) têm outro quantitativo de juros acumulados, segundo dados do sistema financeiro do Banco Central.
Veja simulações para entender a diferença nos consignados de 2022 e 2023:
Com 2,14% de juros
R$ 1.000,00
12 X R$ 95,37
Taxa 2,14% am
Total a pagar: R$ 1.144,49
R$ 5.000,00
12 X R$ 476,87
Taxa 2,14% am
Total a pagar: R$ 5.722,44
R$ 10.000,00
12 X R$ 953,74
Taxa 2,14% am
Total a pagar: R$ 11.144,88
Com 1,97% de juros
R$ 1.000,00
12 X R$ 94,38
Taxa 1,97% am
Total a pagar: R$ 1.132,63
R$ 5.000,00
12 X R$ 471,93
Taxa 1,97% am
Total a pagar: R$ 5.663,16
R$ 10.000,00
12 X R$ 943,85
Taxa 1,97% am
Total a pagar: R$ 11.326,20