InícioEditorialVinhos a funcionários levantaram suspeita sobre fraude em empréstimos

Vinhos a funcionários levantaram suspeita sobre fraude em empréstimos

São Paulo — A relação entre alguns empregados da Desenvolve SP e representantes de empresas suspeitas de fraudes em empréstimos envolvia presentes, vinhos e almoço em restaurante caro, conforme mostram processos internos do banco de fomento do governo paulista e investigações.

Após auditoria que constatou R$ 74 milhões em empréstimos suspeitos, o Metrópoles apurou que oito funcionários chegaram a ser investigados por suspeita de envolvimento no esquema. Quatro teriam sido demitidos, um deles por justa causa.

A Desenvolve SP é um banco de fomento vinculado ao governo de São Paulo que tem como objetivo financiar negócios, a juros baixos, com o objetivo de desenvolver a economia paulista, gerando emprego e renda — atuação parecida com a do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), do governo federal.

Segundo a investigação, as fraudes ocorreram entre os anos de 2021 e 2022, nos governos de João Doria e Rodrigo Garcia, que eram do PSDB e antecederam o governador Tarcísio de Freitas.

A reportagem teve acesso a um processo administrativo que cita o recebimento de presentes irregulares e ao menos um almoço em um restaurante de luxo, em relação com um desses representantes.

Um dos funcionários que foram alvos da apuração admitiu à polícia que era comum o recebimento de vinhos e panetones de, no máximo, R$ 200. No entanto, esses presentes teriam caráter simbólico, teoricamente, não violando as regras do órgão.

Por ora, os funcionários não são alvos de uma investigação na esfera criminal, que corre na 1ª Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Campinas, no interior paulista.

Além dos presentes recebidos, também há citação de relação informal com clientes do banco, uso de e-mail particular para tratativas e também suposta negligência em situações envolvendo potenciais fraudes. Uma das conversas citadas em um processo administrativo indicaria, na visão da Desenvolve SP, um direcionamento do crédito em benefício de um cliente.

A reportagem localizou ao menos dois processos trabalhistas de funcionários demitidos pela Desenvolve SP. Um deles tenta reverter a demissão por justa causa.

O Metrópoles obteve dados inéditos de investigação sigilosa relacionada ao caso, que detectou ao menos 178 operações de créditos suspeitas.

A apuração inicial dos auditores da Desenvolve SP, por sua vez, analisou 340 operações de crédito, classificando as suspeitas de fraude em três níveis: provável (82 casos), possível (96) e remoto (162). Quase R$ 43 milhões foram registrados como prováveis, enquanto R$ 31 milhões foram classificadas como possíveis, e R$ 40 milhões restantes apareceram com remota chance de fraude.

Investigação

A investigação policial que corre em Campinas centra o foco em empresas suspeitas de fraudes, sócios e laranjas. Cinco companhias figuravam como alvos iniciais, além de seus sócios e pessoas apontadas como testas de ferro no esquema.

A polícia avalia que pode haver ligação entre elas, devido a coincidência entre escritórios de contabilidade e de advocacia, valores de capital social iguais, registros apenas na Junta Comercial de Osasco, na Grande São Paulo, independentemente do endereço da empresa, e também a dificuldade de se localizar os sócios e as sedes.

Em um dos casos citados no inquérito, houve um aluguel de uma sala comercial que teria sido montada apenas como encenação para funcionários da Desenvolve SP.

Em outubro do ano passado, foram cumpridos 20 mandados de busca e apreensão em oito cidades, entre elas Campinas e Osasco, além do bloqueio de bens e contas bancárias dos investigados.

O que diz a Desenvolve SP

A Desenvolve SP não deu informações sobre o caso alegando se tratar de um procedimento sigiloso. O banco afirmou que “os casos relacionados à suspeita de fraude estão sendo investigados pela Polícia Civil, que é a autoridade competente para identificar os responsáveis e delimitar a extensão dos danos causados à Desenvolve SP”.

“Já com relação à auditoria, informamos que os relatórios são confidenciais e protegidos por sigilo estratégico”, afirmou o órgão, acrescentando que “é uma instituição financeira, sujeita às normas do Banco Central do Brasil, e que preza pelo dever de sigilo bancário, pela proteção de dados pessoais e que cumpre todos os requisitos previstos na legislação”.

A empresa pública não se pronunciou sobre os processos trabalhistas dos ex-funcionários.

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