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Bahia é o quinto estado em população favelizada no Brasil

Em Salvador,  aglomerados urbanos que o IBGE chama de favelas são mais conhecidos como ‘bairros populares’ e circundam as áreas ‘nobres’

Com o quarto maior número de habitantes do Brasil, o estado da Bahia ocupa o 5º lugar quando o recorte é o número de pessoas vivendo em favelas no pais. Ao todo, 1.059.838 habitantes do território baiano moram em comunidades, o que equivale a 20,5 Arenas Fonte Nova lotadas. Salvador concentra quase metade dos espaços definidos por urbanistas como favelas, de toda a Bahia. Os dados foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e fazem parte da prévia do Censo de 2022.

A depender da região do país, o que se entende por “favela” é diferente. O IBGE denomina essas localidades como “aglomerados subnormais”, que precisam ter uma característica essencial: a ocupação ilegal da terra. Ou seja, as pessoas que vivem nesses locais não são donas daqueles espaços. 

Também é preciso obedecer ao menos um dos critérios como precariedade na oferta de serviços públicos essenciais, urbanização fora do padrão ou estar em locais de restrição de ocupação (faixas de domínio de rodovias, por exemplo). Como os dados são uma prévia do Censo, ainda não é possível determinar os tamanhos exatos de cada favela de Salvador ou dos demais municípios baianos onde existem essas estruturas urbanas. 

Sabe-se, no entanto, que na capital os aglomerados são encontrados em bolsões espalhados em diversos bairros, inclusive aqueles definidos como ‘nobres’. 

Termo carioca
O professor do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Clímaco Dias, explica que a denominação “favela” não é utilizada entre os baianos. “Aqui nós nunca chamamos de favela, quem chama assim é o Rio de Janeiro. A gente chama de avenida, bairro pobre, bairro popular, entre outros”, diz. 

Mariana Viveiros, coordenadora de divulgação do Censo 2022 na Bahia, lembra que no Censo passado, realizado em 2010, os bairros de Valéria e Pernambués eram os que mais concentravam os ‘aglomerados subnormais’ na cidade. Para Mariana, a tendência é que esses espaços estejam ainda maiores. Um estudo realizado pelo IBGE em 2019 mostrou que cerca de 40% dos domicílios de Salvador estavam em áreas consideradas de favela.

“São 417 municípios na Bahia e só 33 deles possuem aglomerados subnormais. Em 2019, o IBGE identificou 572 áreas desse tipo no estado, sendo que 270 estavam em Salvador. Depois, está Feira de Santana e Itabuna [como os de maior concentração]”, explica. 

No Censo de 2010, a Bahia ocupava o 4º lugar em favelização, o que ainda pode se repetir já que a pesquisa ainda não foi concluída. Como Censo deste ano está em andamento, não é possível elencar aspectos de gênero, raça e renda nessas localidades.

Apesar disso, Mariana Viveiros explica que essas são consideradas questões históricas e sociais e que, por isso, não devem ser alteradas. “A gente tem as informações do Censo de 2010 e o perfil provavelmente não muda tanto. Temos predominância de pessoas pretas e pardas e de baixa renda”.

Já Clímaco Dias defende que os moradores desses locais possuem uma “cidadania incompleta” por não terem seus direitos garantidos como deveriam, o que independe de questões financeiras. Também é característico desses locais o deslocamento de adultos para trabalharem em outros bairros, enquanto crianças e adolescentes acabam restritas à localidade devido ao acesso de serviços básicos.  

“Nos bairros populares, a polícia e o tráfico fazem o que querem. Então, as pessoas não têm garantias constitucionais mínimas”, explica o professor.

Fuga dos estereótipos 
Não é novidade que bairros populares costumam receber destaque quando situações ruins acontecem, especialmente episódios violentos. Foi pensando nisso que o poeta Sandro Ribeiro, conhecido como Sandro Sussuarana, decidiu fundar o Sarau da Onça (@saraudaonca), em 2011.

Mudar a forma como o bairro de Sussuarana é visto pelas pessoas de fora e pelos próprios moradores foi o motor para a criação do coletivo que desenvolve ações culturais, educacionais e de formação para jovens. “Começamos com o projeto para fomentar a ideia de que a periferia produz muito mais cultura do que violência”, afirma Sandro.

A menos de 20 km de distância, no Engenho Velho de Brotas, outra iniciativa de um morador da comunidade ganhou destaque nas redes sociais. O perfil Nosso Engenho no Instagram acumula mais de 13 mil seguidores e foi criado pelo estudante de Ciências Sociais Carlos Sabino, que se apresenta como Jota. 

Há 12 anos, Jota criou um site para ser o canal de comunicação e divulgação de ações da comunidade. Além de festas, no perfil são divulgados serviços de saúde e sociais. “Criamos um canal de divulgação que dá visibilidade às atividades sociais e culturais do Engenho porque a grande mídia só costuma vir aqui quando há crimes”, diz.

Uma em cada três pessoas não respondeu ao Censo em Salvador
Saber com mais profundidade as mazelas da cidade para que políticas públicas funcionais sejam implementadas é um dos objetivos do Censo que ocorre a cada dez anos no país. Porém, isso só é possível quando a população contribui, o que parece não estar acontecendo efetivamente em Salvador. Na cidade, uma em cada três pessoas não respondeu a pesquisa, segundo o IBGE. 

Mariana Viveiros afirma que a recusa em participar é pequena na Bahia, de apenas 1,5%. Por outro lado, tem sido difícil manter os recenseadores trabalhando e acessando certos locais. Até a chuva dos últimos dias atrapalhou os trabalhos.

“Nas cidades maiores, como Salvador, temos dificuldades de acessar algumas áreas nos extremos da distribuição de renda. Tanto em condomínios de alto padrão que não querem ‘interfonar’ para os moradores, como em localidades consideradas violentas”, explica. 

O ritmo lento fez com que as projeções de finalização do Censo 2022 fossem estendidas e em janeiro do ano que vem os recenseadores vão continuar nas ruas. Isso deve acontecer em 145 das 417 cidades da Bahia, inclusive a capital, que possui 66% de área recenseada. 

Cidades com mais pessoas vivendo em favelas:
São Paulo (2,081 milhões)
Rio de Janeiro (1,549 milhão)
Amazonas (1,244 milhão)
Pará (1,179 milhão) 
Bahia (1,059 milhão)
Fonte: IBGE

Entenda os termos:

Favela: O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano do Rio de Janeiro (em vigor desde 2011), define favela como: “Área predominantemente habitacional, caracterizada por ocupação clandestina e de baixa renda, precariedade da infraestrutura urbana e de serviços públicos, vias estreitas e alinhamento irregular, ausência de  vínculos de propriedade e construções não licenciadas, em desacordo com os padrões legais”. O IBGE segue definição semelhante. Na Bahia, o termo não é usado e o mais comum é ‘bairro popular’;

Comunidade:  Em Sociologia, o  termo define grupo local, de tamanho variável, integrado por pessoas que ocupam território geograficamente definido e estão unidos pela mesma herança cultural e histórica. No Brasil, usa-se comunidade como um sinônimo para favela, já que esse último é considerado pejorativo por grupos mais engajados da sociedade civil; 

Periferia:  Segundo artigo acadêmico publicado pela SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso das Ciências, no contexto da história do Brasil, a periferia surge da metropolização do país [anos 1960-70] e define os loteamentos à margem das áreas centrais das cidades, onde vive a população de baixa renda; 

Subúrbio:  No mesmo artigo da SBPC, está explicado que o termo subúrbio, na origem, definia espaços intermediários entre o centro das cidades e as zonas rurais. Os cariocas  passaram a usar subúrbio como sinônimo de periferia e com conotação pejorativa. Com a urbanização, o subúrbio passa a designar  bairros mais afastados do miolo das cidades, mas que têm  infraestrutura mínima de serviços públicos e transporte, onde geralmente vivem as classes C e D;

Complexo: É a zona urbana que reúne um conjunto de favelas interligadas. O termo é mais usado no Rio de Janeiro

*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo.

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