No início da semana, os grupos de hackers AntiSecBRTeam e iPiratesGroup, anunciaram uma série de ataques contra sites de bancos brasileiros
— um por dia, até sexta-feira —, em uma operação batizada de #OpWeeksPayment. Na segunda-feira, o site do banco Itaú Unibanco foi o primeiro alvo dos ataques e ficou indisponível durante alguns momentos. Ontem, foi a vez de o Bradesco ter o acesso à sua página comprometido. Na manhã de hoje, o site do Banco do Brasil sofreu com instabilidades. Apesar da repercussão que os ataques têm gerado nas redes sociais, especialistas afirmam que eles são menos nocivos do que parecem e fazem parte de uma nova era do ativismo do digital pela qual estamos passando.
— Um dos pilares da segurança digital é a disponibilidade. O que esses hackers estão fazendo é atingir a disponibilidade dos sites com os chamados ataques de Negação de Serviço Distribuída (DDoS, na sigla em inglês). É uma ação simples em que, por meio de ferramentas e voluntários, os hackers aumentam o número de acessos a um site para além do que ele pode suportar, o que o retira do ar. Não há roubo de dados — explica Nelson Rufino, consultor de segurança da informação.
Em entrevista por e-mail, os grupos AntiSecBRTeam e iPiratesGroup, responsáveis pelos ataques, confirmaram que os correntistas dos bancos não devem ficar preocupados quanto à segurança dos seus dados e ao dinheiro, já que o objetivo da ação seria chamar a atenção da população e “incentivar a grande masssa a lutar pelos seus direitos para poder viver em um país com menos desigualdades”.
— De maneira geral, as empresas não veem esses ataques como um grande problema. Dependendo da empresa, pode haver um prejuízo em sua imagem, mas as consequências técnicas não vão além do que um site fora do ar por alguns momentos. É como quando alguém vai fazer uma compra em uma loja e a atendente avisa que o sistema está fora do ar. Só há um inconveniente momentâneo — afirma Rufino.
A subcultura hacker, ligada à invasão de computadores, programas ou redes, não necessariamente com objetivos maliciosos, data do início da década de 60 e tem crescido em popularidade desde então. A rápida evolução da tecnologia e a grande disseminação da internet nas últimas décadas são fatores cruciais para esse crescimento. Além disso, diversos produtos culturais contribuíram para a formação do imaginário da figura do hacker como alguém fora da lei e capaz de grandes façanhas na internet. Nesse sentido, são icônicos o livro “Neuromancer”, de 1984, do americano William Gibson, conhecido como o “profeta noir” do cyberpunk e criador do termo “cyberespaço”; a trilogia cinematográfica Matrix; e, mais recentemente, a série de livros best-sellers “Millennium”, do escritor sueco Stieg Larsson (morto em 2004) e cuja adaptação cinematográfica conduzida pelo diretor David Fincher foi lançada recentemente nos cinemas.
— Dificilmente você encontra um hacker que não tenha como livros de cabeceira as obras de David Gibson — afirma Murilo Machado, pesquisador coautor do livro “Software livre, cultura hacker e o ecossistema da colaboração”.
Na última década, com a emergência das redes sociais, a organização e o tamanho dos grupos de hackers vêm crescendo devido às facilidades de contato e de disseminação de ideias que esses meios oferecem. O resultado desse processo é um crescimento do ativismo on-line, que tem no hackerativismo uma de suas principais facetas, e que, atualmente, é sintetizado nas ações do grupo Anonymous.
— Não tenho dúvida de que estamos vivendo um momento especial do ativismo na internet, que vem crescendo nos últimos anos. A grande guinada se deu em 2008, com o renascimento do Anonymous e o início de sua luta por causas políticas — afirma Murilo Machado. — O ano de 2011 possivelmente foi o ano em que mais se noticiaram ataques hackers na História.
Para o consultor Rufino, a grande questão atual é que os grupos hackers vêm cada vez mais se utilizando de ideologias para se legitimarem, mas suas ações nem sempre condizem com suas ideias.
— Como em qualquer tipo de manifestação, muitas vezes essas ideologias são utilizadas apenas como forma de reunir adeptos a uma causa e voluntários para os ataques. No caso do Brasil, um mote comumente usado é o da corrupção. Na prática, entretanto, as ações muitas vezes pouco têm a ver com o combate direto à corrupção, o que acaba esvaziando a ideologia do movimento — afirma Rufino.
Fonte | O Globo