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Defesa de homem amarrado por PMs alega furto por fome e pede soltura

A defesa do homem negro suspeito de furtar chocolates em um supermercado, que teve as mãos e pés amarrados e foi carregado por policiais militares, na Vila Mariana, em São Paulo, entrou nesta sexta-feira, 9, com pedido de reconsideração da decisão judicial que o manteve preso.

De acordo com o advogado José Luiz de Oliveira Júnior, um dos defensores, o pedido foi protocolado no plantão judiciário e a expectativa é de que seja analisado ainda neste fim de semana. A defesa alega que se trata do chamado furto famélico, cometido em razão do estado de necessidade do suspeito.

Segundo Oliveira Júnior, o homem acusado é morador de rua e vive em situação de extrema vulnerabilidade, assim como o outro homem e o menor que também teriam participado do furto. “Eles foram movidos pela fome, pela necessidade de se alimentar. No caso da pessoa que foi amarrada, ela foi pega com alguns bombons, que estava comendo para matar a fome. Não negou o furto, não resistiu como foi dito pela polícia”, disse.

No pedido de reconsideração, o mesmo Juízo pode rever a decisão, sem esperar o julgamento do habeas corpus, também apresentado pela defesa ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

O homem foi preso na madrugada de segunda-feira, 5, depois que o furto foi denunciado pelo supermercado. Em imagens de um vídeo amplamente divulgado em redes sociais, é possível ver quando os policiais militares transportam o homem amarrado pelos pés e pela mãos e o jogam em uma maca, no interior de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Em seguida, o suspeito é colocado na traseira de uma viatura e levado ao plantão da Polícia Civil.

Após a prisão, em audiência de custódia, a juíza plantonista Gabriela Marques da Silva manteve a prisão do suspeito pelo furto de duas caixas de chocolate. Segundo ela, as imagens das câmeras do supermercado comprovaram o ato criminoso. Além disso, o suspeito já tinha condenação e estava em regime semiaberto. Outro homem que participou do furto foi solto por não ter antecedentes criminais.

Além de converter a prisão em flagrante em preventiva, ela entendeu que não houve irregularidade na abordagem da Polícia Militar. “Não há elementos que permitam concluir ter havido tortura, maus tratos ou ainda descumprimento dos direitos constitucionais assegurados ao preso”, disse a juíza.

O suspeito compareceu à audiência de custódia acompanhado por defensor público. Segundo o advogado, como as imagens mostrando a abordagem policial foram divulgadas só depois da audiência, a juíza não teve acesso a elas. “São vários fatos que precisam ser ponderados. Essas pessoas vivem em situação degradante há muito tempo, então não há corrupção de menores, pois não se provou que o menor foi cooptado ou convidado para o furto. A ilegalidade da prisão é flagrante: por que os policiais levam cordas na viatura? Onde estavam as algemas?”, questionou.

Oliveira Junior disse que a própria Polícia Militar reconheceu a abordagem em desacordo com o procedimento padrão da corporação. “Em hipótese alguma estou defendendo o crime, só que não houve uma prisão convencional. Um homem negro, pobre, em situação de rua nos remete àquele caso da estudante de medicina que desviou mais de R$ 1 milhão dos colegas. É uma jovem branca, universitária e foi tratada pela polícia e pela justiça com o respeito que toda pessoa, mesmo sendo acusada de um crime, merece. Por que o cidadão que estamos defendendo precisa ser tratado de forma diferente?”

Ele refutou a versão dos policiais de que o suspeito ameaçou dar tiros na polícia e representava uma ameaça à segurança dos PM. “Como pode um homem desarmado, fragilizado pela vida que leva representar ameaça a quatro policiais treinados e armados? É preciso ir mais a fundo na conduta da polícia.”

O escritório OES Advogados, do qual Oliveira Junior faz parte, assumiu voluntariamente a defesa do suspeito – ele não teve o nome divulgado – e pretende acionar os policiais por abuso de autoridade. “Entramos no caso para colaborar com a Defensoria Pública. Se outros advogados quiserem entrar no caso, toda ajuda será bem vinda”, disse.

A Defensoria Pública de São Paulo disse, em nota, que em cumprimento a suas atribuições legais, atuou na audiência de custódia em favor da pessoa presa no referido caso, já tendo feito pedido à Justiça para adoção das medidas legais cabíveis em relação à situação.

“Em relação ao vídeo que mostra o ato da prisão, a Defensoria teve acesso somente após a audiência de custódia e, com base nele, solicitou imediatamente ao Juízo a tomada de providências e impetrou habeas corpus.”

Procurado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) informou que não se manifesta a respeito de questões jurisdicionais. A reportagem não conseguiu contato com a juíza que atuou no caso.

A Polícia Militar disse em nota que foi instaurado um inquérito para apurar todas as circunstâncias relativas às ações dos policiais envolvidos no episódio. Eles foram preventivamente afastados das atividades operacionais, uma vez que as ações estão em desacordo com o padrão de procedimentos da corporação. Imagens registradas pelas câmeras, inclusive as câmeras corporais dos policiais, estão sendo analisadas.

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