O novo Marco Fiscal, aprovado pelo Congresso Nacional, foi sancionado, com vetos, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na quinta-feira (31/8). Dois trechos do texto foram vetados pelo petista, o que levantou preocupações relacionadas à responsabilidade fiscal do governo.
O primeiro trecho vetado por Lula é uma das regras de um artigo que trata das condições para que o gestor público não seja enquadrado na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) quando descumprir o limite inferior do resultado primário.
Pelo trecho suprimido pelo presidente, as despesas de investimentos do Poder Executivo poderiam ser reduzidas até a mesma proporção da limitação sobre o conjunto das demais despesas discricionárias. Segundo o governo, a regra vetada pelo petista poderia ter “impacto potencial sobre despesas essenciais da União”. Na prática, a decisão de Lula faz com que sejam novamente permitidos descontos de despesas no resultado fiscal.
O segundo trecho vetado proibia o governo de prever na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a exclusão de despesas do resultado primário. Essa foi a forma encontrada pelos governos anteriores do PT de cumprir a meta fiscal mesmo com ampliação de gastos com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), agora remodelado em uma nova versão.
Os dois vetos de Lula ao Marco Fiscal serão analisados pelo Congresso e podem ser derrubados.
Para o ex-secretário estadual da Fazenda de São Paulo Felipe Salto, economista-chefe e sócio da Warren Renascença, o veto de Lula ao item que proibia o governo de excluir despesas do resultado fiscal é um “mau sinal”.
“Retira-se do texto a proibição explícita para prever exclusões ou descontos na hora de verificar o cumprimento da meta fiscal. A chamada contabilidade criativa legou muitos problemas às contas públicas e à economia, em período recente, e esse dispositivo funcionaria como espécie de vacina contra novas tentativas. Ao retirá-lo, o governo dá um mau sinal nesse aspecto”, afirmou Salto ao jornal O Estado de S. Paulo.
Um dos maiores desafios da equipe econômica, que parece cada vez mais difícil de ser cumprido, é zerar o déficit primário em 2024 – ou seja, o governo terminaria o ano que vem com despesas equivalentes às receitas e sairia do vermelho. A meta foi mantida no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2024, encaminhado ao Congresso.
“O governo manterá a meta zero, como já reafirmou. Não há razão para querer descontos na meta, porque o arcabouço fiscal prevê eventual rompimento. No caso de rompimento, devem-se acionar os gatilhos e ponto. Isso é fazer valer o arcabouço”, completou Salto.
Para o economista, no entanto, o outro veto de Lula ao Marco Fiscal, que facilita o contingenciamento de investimentos, é positivo. “Acabaria por restringir fortemente o grau de liberdade do gestor em momentos de necessidade de contenção para cumprimento da meta fiscal”, diz.
Novo Marco Fiscal Uma das prioridades da equipe econômica neste primeiro ano de governo, o Marco Fiscal (leia aqui os principais pontos da nova lei) substituirá o teto de gastos, criado em 2016, no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB).
Em linhas gerais, enquanto o antigo teto indicava que o aumento das despesas para o ano seguinte não poderia superar a inflação, o Marco Fiscal inclui outras variáveis. O texto prevê crescimento real das despesas, acima da inflação, entre mínimo de 0,6% e máximo de 2,5%. O valor dependerá da receita do ano anterior e se o governo cumprir ou não as metas fiscais estabelecidas.
O formato também é diferente da Lei de Responsabilidade Fiscal, usada como a principal métrica antes do teto de gastos e cujo objetivo era a geração de qualquer superávit, sem metas específicas.
No novo marco, a principal mudança é a criação de uma meta de resultado primário (a diferença entre o que é arrecadado pelo governo e as despesas). O governo terá de buscar ficar dentro de uma banda, similar ao que ocorre nas metas de inflação.