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‘Nostalgia e realização’: o que está por trás do fenômeno RBD após 15 anos do fim do grupo

Às 22h da última quinta-feira (19), a notícia que o assistente administrativo Gabriel Serapião, 26 anos, tanto esperou nas últimas semanas foi finalmente anunciada. Depois de quase 15 anos sem atividade, o grupo mexicano RBD divulgou as datas da Soy Rebelde Tour, a turnê de retorno que passará pelo México e pelos Estados Unidos, além do Brasil. 

“Meu eu de nove anos nem cogita a possibilidade de não ir a esse show – ou shows – se tudo der certo. A programação já vem desde o blackout nas redes sociais dos integrantes”, conta Gabriel, referindo-se a uma ação de marketing digital que apagou todas as postagens nos perfis oficiais da banda e dos membros, no mês passado. 

Desde dezembro, ele afirma que não fez nenhuma dívida: todo dinheiro que entrava já ficava reservado para os gastos com ingressos, passagens e outras despesas. Como ele, provavelmente alguns milhares de baianos fãs da banda se juntaram aos milhões que assistiram à live do anúncio oficial, transmitida no Tiktok, e em telões físicos ao redor do mundo, incluindo Copacabana e o Parque do Ibirapuera. 

No Brasil, até o momento só foram anunciados dois shows: um no dia 17 de novembro, no Rio de Janeiro, e outro no dia 19 de novembro, em São Paulo. Os valores das entradas começam em R$ 195 e vão até R$ 850. A banda é considerada até hoje um dos maiores sucessos da música latina em todo o mundo.  Entre 2004 e 2009, eles fizeram quatro turnês mundiais e venderam 15 milhões de discos.

Para Gabriel, em suas próprias palavras, é uma realização pessoal. Além de ter acompanhado o grupo desde 2005, será o momento de conhecer também os amigos virtuais que encontrou ainda nos tempos do Orkut, nas antigas comunidades de fãs. “Hoje a maioria já tem suas vidas, não depende mais dos pais, tios e avós, como era lá atrás. Além de vivenciar um show deles, é remeter a uma época inocente, mas que ao mesmo tempo foi marcante para muitos”, diz. 

Nos últimos dias, o engajamento relacionado ao RBD só aumentou nas redes sociais. Além de terem atingido os trending topics do Twitter algumas vezes nas últimas semanas, centenas de vídeos têm viralizado em redes como Tiktok e Instagram. Mas por que uma banda que acabou há 15 anos tem gerado tanta comoção? 

“Existe uma questão que está relacionada a todo grupo de fãs que é o engajamento afetivo, financeiro e temporal. Isso gera essa conexão tanto em relação aos fãs entre si, porque há uma rede de relações, quanto com a banda”, diz a pesquisadora e crítica de cinema Enoe Lopes Pontes, que estuda fandoms (grupos de fãs) em seu doutorado. 

De acordo com ela, quando uma comunidade de fãs é receptiva e as pessoas que fazem parte dela se sentem acolhidas, a tendência é que essa comunidade perdure, se houver uma ligação forte com o produto. “Acredito que o que acontece com o RBD é que são esses dois polos: é um material que cria engajamento do público e, ao mesmo tempo, a comunidade de fãs deve ser acolhedora. As pessoas devem se sentir parte de uma coisa especial”, analisa.

Novela
O RBD foi formado, originalmente, com os atores da novela Rebelde. Lançada no México em 2004, a produção estreou no Brasil em 2005, como parte da programação do SBT. Era uma versão de uma novela argentina – Rebelde Way, que, por sua vez, deu origem à banda Erreway. No Brasil, em 2011, a Record chegou a produzir a novela Rebelde, da qual saiu a banda Rebeldes. No entanto, nenhuma se comparou ao sucesso dos mexicanos. 

Na época, eram seis integrantes: Anahí, Christian, Christopher, Dulce Maria, Maite e Alfonso Herrera, conhecido como Poncho. Este último, porém, não vai retornar para o projeto. Desde 2009, quando lançaram o último álbum, ele diz que quer focar apenas na carreira como ator. 

Como já gostava de novelas mexicanas e de produções sobre o universo adolescente, a bancária Luana Cardoso, 30, logo se interessou por Rebelde. Chegava a recusar convites para encontrar com amigos para ver os capítulos da novela todos os dias. 

Ela pretende ir ao show de São Paulo, mas diz que sabe que vai esgotar “em segundos”. “A diferença é que o sentimento de hoje é nostálgico. Será igual a turnê de Sandy e Júnior. Vai ser minha adolescente de 2005 vivíssima e gritando muito”, diz. 

Apesar de terem vindo ao Brasil sete vezes, o RBD nunca fez nenhum show em Salvador. Para o designer gráfico Ian Barbosa, 31, uma das grandes tristezas foi que não tinha condições de viajar para algum show. Na época, morava no interior do estado e ainda era muito novo. 

O período em que Rebelde estreou coincide justamente com sua pré-adolescência e com o momento em que estava começando a usar mais a internet.

“Eu pesquisava muito sobre a novela, a versão original argentina e foi quando comecei a participar das comunidades no Orkut. Tenho um grupo de amigos que começou a partir desses grupos e seguimos até hoje nos falando. Acho que esse foi um dos laços mais fortes a partir do fandom RBD. Crescemos juntos”, explica.

Para ele, hoje, é diferente acompanhar o grupo. “Sou adulto, tenho minhas ressalvas em relação ao posicionamento de alguns integrantes”, admite.

Desde o início da pandemia da covid-19, parte dos fãs do RBD passaram a criticar Christopher Uckermann, um dos integrantes do grupo, por falas negacionistas quanto ao coronavírus e à vacina. Já Dulce Maria e Maite, duas das mulheres, foram criticadas nos últimos anos por falas consideradas contrárias ao feminismo e à luta das mulheres por igualdade de gênero. 

Redes sociais
Além disso, o RBD praticamente não conviveu com redes sociais. Na época, o Orkut apenas começava a dar seus primeiros passos no Brasil. Para a fisioterapeuta Graziela Trindade, 29, a possibilidade de interagir com eles a cada nova postagem no Instagram ou no Twitter é uma das diferenças de seguir o grupo atualmente. 

Também fã da novela, ela também criou uma relação com as amigas no colégio sobre a novela. Começou a comprar CDs, posters e revistas até que se tornou fã. “Depois de um tempo, montamos um cover para nos distrair. Dançava em frente à TV com o primeiro DVD que eles lançaram, o Tour Generación. Fazia cover da Maite e era apaixonada por cada detalhe deles”, conta. 

Depois do fim da banda, ela também seguiu acompanhando a carreira solo dos integrantes. Chegou a conhecer Anahí, Christian e Christopher em outras passagens pelo Brasil, nos chamados ‘meet and greet’ – os pacotes de encontro para foto com os artistas, que costumam ser vendidos por preços maiores e antes das apresentações. 

Por isso, ela também considera o show no Brasil agora como um sonho.

“A minha programação está sendo com amigos. Estamos planejando o dia, vamos comprar passagem antecipada, comprar o ingresso. Vai ser um presente para mim mesma e uma dívida que tenho com a Grazi de 2004”. 

Ainda segundo a pesquisadora e crítica Enoe Lopes Pontes, existem diferentes aspectos que fazem com que fenômenos como o RBD aconteçam. Há desde questões de comunicação até pontos geracionais, em especial se são produções que alcançam grupos jovens. 

“A gente pode comparar com outros fenômenos semelhantes, como Glee e High School Musical, que envolvem essa coisa da musicalidade e das tramas adolescentes que criam a conexão direta com o público jovem. Eles se apegam e se envolvem com as músicas e com os enredos”, completa. 

 

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