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Tão perto, e tão longe: conheça baianos que vivem perto do Carnaval sem gostar da festa

Considerada por muitos a maior festa de rua do planeta, o Carnaval de Salvador é sinônimo de alegria para todos os que vivem na cidade, afinal, ‘We are Carnaval, we are folia’, como diz a música. Para quem mora no centro da festa e se encontra a poucos metros dos trios, então, deve ser como estar no paraíso, certo? Bom, há controvérsias…

A aposentada Sônia Garrido, 75 anos, mora na Avenida Princesa Isabel, que funciona como escoamento para quem está no circuito Dodô (Barra–Ondina) e quer ir em direção à Graça ou à Avenida Centenário, já que transitar pela Ladeira da Barra se torna impraticável. “O isolamento é total. São bloqueadas todas as condições de lazer que não a folia. Como sou idosa e não dirijo, não tenho nem a alternativa do Uber”, lamenta Sônia. 

Para poder ser socorrida em caso de alguma urgência médica, a moradora tem que credenciar os carros de seus irmãos, também idosos. “A auxiliar doméstica não pode vir. Além disso, o condomínio tem que contratar mais vigias. Na verdade, passo uma semana trancada em casa”, acrescenta ela, que, ao contrário dos que gostariam que ‘a fantasia fosse eterna’, fica em contagem regressiva pelo fim do Carnaval. 

Para a jovem Louise Oliveira, 22, o maior transtorno causado pela folia também é o fato de as ruas ficarem interditadas. Mas há outros elementos que a incomodam. “Não gosto do estilo de música nem da quantidade de pessoas. Também tem a questão da violência”, lembra a moradora do Jardim Apipema. 

“Geralmente, eu viajo. Se não viajar, fico em casa mesmo”, diz Louise, que, neste ano, optou por ‘se enclausurar’, assim como Sônia, enquanto seus pais viajam.

A estudante Louise Oliveira, 22 anos, vai ficar em casa (Foto: acervo pessoal)

No caso de uma estudante que prefere preservar sua identidade, o que a afasta do Carnaval é, principalmente, a falta de identificação com a festa. Moradora da Avenida Milton Santos, em Ondina, há apenas quatro meses, a jovem é adventista do sétimo dia. “Por conta disso, eu não bebo nem vou a festas e acabo não gostando muito desses ambientes que têm muita gente bêbada ou que são muito tumultuados, como é o caso do Carnaval”, justifica. “Não é que eu odeie; é que eu não me identifico com esse tipo de lugar e acabo não me encaixando.” 

Ela, porém, se sente prejudicada pelas mudanças que o evento causa em seu bairro. “A coisa que eu mais reclamo é que o transporte por aplicativo fica muito caro. […] Por exemplo, se eu ia de Ondina pra Brotas, antes dessa montagem toda da festa, dava uns 8 reais de moto; agora, tá dando 15”, relata a estudante, que vive sozinha e precisa economizar dinheiro. 

Por trabalhar em regime de home office, ela decidiu alugar seu apartamento e passar uns dias distante dos circuitos da folia, em Patamares, na casa de um parente. “Não teria como eu não ser afetada pelo barulho que o Carnaval acaba causando ali”, explica.

‘Modelo’ atual incomoda 
O publicitário Waltson Campos, 52, também resolveu fazer as malas e deixar o Jardim Brasil, onde vive, durante o período. Mas, diferentemente de suas ‘vizinhas de circuito’, tomou essa decisão apenas porque prefere aproveitar a oportunidade para conhecer outros lugares, onde possa ficar mais sossegado. 

“Acho que as pessoas não são contrárias à festa, e sim ao modelo atual implementado por causa dos transtornos, que poderiam ser minimizados, mas não são. Achar alguém que não goste de Carnaval é difícil”, opina Waltson. 

O publicitário Waltson Campos aproveita o período para viajar (Foto: Acervo pessoal)

É a situação de Ana Melão, residente da Barra: apesar de gostar da festa, tem ressalvas quanto à organização e ao comportamento dos foliões. “As pessoas acham que, vendo aquela bagunça toda, não precisam ter um regramento do social adequado”, reclama. 

Na opinião dela, os moradores se sentem “oprimidos pela imposição da bagunça que o Carnaval na Barra gera nas vias públicas”. “O problema não é o Carnaval; é a forma que ele é colocado, em que a gente tem que pagar pra se proteger, com tapumes”, esclarece ela. “Eu vou ficar aqui até amanhã [quinta] e, depois, vou sair. Não vou mais ficar em Salvador, porque é muito transtorno”, afirma. 

Definir limites do direito à manifestação cultural é ‘muito difícil’, avalia especialista 

De acordo com o advogado Alexandre Medeiros, especialista em Direito Público, esclarecer os limites do direito de quem vive perto dos locais de realização dos festejos carnavalescos e do de quem vai ao evento para curtir “é um tema extremamente complexo, porque envolve a necessidade de ponderação de inúmeros fatores”. 

Medeiros argumenta que o Carnaval pode ser considerado patrimônio cultural imaterial, como ocorre no estado de São Paulo e em Maragogipe, no recôncavo baiano. ‘Assim, há um conflito entre bens jurídicos relevantes. Por um lado, a cultura, que tem sede constitucional; por outro, a paz e o sossego (também reflexos da dignidade humana), que restam atingidos, sobretudo em situações mais sensíveis, como de crianças, idosos e doentes”, pondera. 

O advogado recorda que a Constituição Federal estabelece que ‘o Estado protegerá as manifestações das culturas populares’. No entanto, faz um contraponto com o entendimento que teve o Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da vaquejada, outra forma de manifestação cultural. A decisão do STF gerou uma reação do Legislativo, que, por sua vez, em 2017, alterou o texto constitucional. 

A mudança fez a discussão retornar à Suprema Corte, que ainda não proferiu novo julgamento sobre a questão. “O STF entendeu que a prática é manifestamente inconstitucional, por causar crueldade aos animais envolvidos. No caso, a cultura foi contraposta à necessidade de proteção ao meio ambiente, tendo prevalecido esta última”, explica Medeiros. 

No caso do Carnaval, o especialista em Direito Público considera ‘muito difícil’ definir com precisão os limites do direito à manifestação cultural. “Contudo a legislação e as normas administrativas municipais, que regulam a realização da festa, são um bom ponto de partida para se verificar a ocorrência de eventuais abusos”, ressalvou ele. 

O Correio Folia tem patrocínio da Clínica Delfin, apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador e apoio da Jotagê e AJL. 

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