Salvador é um lugar que traz boas memórias à multiartista Elisa Lucinda. Mulher, de pele preta, íris cor de mel e uma mente criativa, ela volta à capital baiana para mais um lançamento: o seu 19º livro, Quem me Leva para Passear, ilustrado por David Lima e publicado pela Editora Malê. O evento acontece na Casa do Benin (Pelourinho), neste sábado (30), a partir das 17h e contará com a participação de artistas como Fabrício Boliveira, Glenda Nicácio e Aldri Anunciação, que lerão trechos da obra: “eu quero festa!”, brinca Elisa.
Elisa conversou com o CORREIO enquanto andava pelas ruas de Maragogipe, onde toca um projeto social para a formação profissional de diversos quilombolas ,junto à chef Paola Carosella, que escreve numa das orelhas do novo livro.
“Lancei a maioria dos meus livros aqui, isso não é uma novidade, não”, afirma com a voz meio rouca e cheia de alto astral que lhe é característico. “O que acontece na Bahia acho que acontece no Brasil. Tem uma compreensão, um humor, uma coisa pra mim que é uma onda de muita compreensão da minha arte”, completa.
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Em Quem me leva pra passear, Elisa lança mão da escrita em primeira pessoa, convocando uma narrativa intimista e subjetiva sobre Edite, personagem que vem de seu último romance, Livro do Avesso: o Pensamento de Edite. A autoficção poética é provocante, carregada de afirmação política e filosofia ubuntu.
As personagens de Elisa trazem o tom de sua versatilidade, do talento arejado e da ação multiprofissional que evidenciam ainda a potência das mulheres negras na arte brasileira. Por isso, seu texto e sua postura ético-política nas redes, no trabalho de articuladora cultural e como realizadora também trazem a luta contra o racismo, o sexismo e toda forma de opressão.
“Edite são muitas. É um alterego meu e ao mesmo tempo de muitas mulheres. Quem escrevia sobre as mulheres eram os homens porque as mulheres não podiam estudar, aprender a ler, nem tinham autorização para escrever. As mulheres brancas foram as primeiras a terem acesso à leitura e estudo, ela escreviam por nós também. Depois mais tarde nós escrevemos por nós e está cada vez mais aumentando a quantidade de mulheres que escrevem e contam suas próprias histórias. Esse livro é uma história sobre a liberdade de pensar num país tão atrapalhado nesse lugar”, explica Elisa.
As histórias de Edite são frutos do pensamento de Elisa. Nasceu enquanto estava com uma série de prazos apertados para entregar uma biografia não autorizada de Fernando Pessoa e uma outra produção. Com a cabeça cheia, começou a escrever seus pensamentos no celular, com um diário que chamou Avesso.
“Ali estava o meu avesso porque minha parte cognitiva estava ocupada com tarefas. Escrevi avesso no celular e meus pensamentos mais esdrúxulos, mais íntimos, mais sem censura eu colocava ali. E veio se criando um estilo que não era bem eu. Quando me dei conta, tinha 80 pensamentos escritos no Avesso e descobri Edite. Ela estava pronta e sua vida era contada por uma narradora que estava em sua mente” . O volume de contos foi llançado em 2019 pela Editora Malê – editora carioca dedicada cada à literatura afro-brasileira, criada em 2015 por Vagner Amaro e Francisco Jorge.
Amiga de longa data de Lázaro Ramos, que a conheceu durante uma temporada do projeto Julho em Salvador – quando se apresentou na Sala do Coro e ele, com cerca de 16 anos, assistiu à todas as sessões – ela conta que o diretor quer transformar seus escritos em filme.
“Provavelmente vai virar uma série, estamos trabalhando nisso. Pode ser um longa, vai para o audiovisual, Lazaro está a fim de produzir, tá super envolvido com Edite”, contou Elisa. Os dois já gravaram juntos o filme Papai é Pop, de Caíto Ortiz, no qual ela interpreta a mãe de Lázaro.
Capa de Quem Me Leva Pra Passear (Foto: Divulgação) |
Quem Me Leva Para Passear é vendido por R$48. Pode ser comprado no lançamento, nas editoras LDM, na Escariz e na Katuka (Pelourinho). Além disso, também é possível adquirir exemplares no site da Malê (https://www.editoramale.com.br/)