Após sucessivos adiamentos para pagamento dos 10% restantes da primeira parcela dos precatórios do Fundo de Desenvolvimento da Educação Fundamental (Fundef), professores esperam que o Governo da Bahia deposite o rateio até o início de fevereiro. Segundo a Secretaria da Administração do Governo do Estado da Bahia (Saeb), o repasse vai ser feito até 10 de fevereiro.
Educadores reclamam que a situação gera estresse entre a classe porque esperavam receber o valor total da primeira parcela até o final de 2022. Os beneficiados receberam 90% do valor inicial a que têm direito em setembro. Os outros 10% deveriam chegar até dezembro.
O governo adiou a data depois de esticar o prazo de entrega dos requerimentos de quem reivindicava o pagamento mas não estava na lista de beneficiários. O resultado do julgamento de solicitações para inclusão dos nomes na lista de beneficiários dos precatórios foi publicado nesta quinta-feira (26) no Diário Oficial do Estado.
Ao todo, 84 mil profissionais estão aptos para receber o abono. O saldo total dos 10% ronda R$ 140 milhões, valor que contempla pagamento aos recém-inclusos e saldo restante a quem recebeu a primeira parcela em 2022. O valor individual varia conforme a carga horária de cada professor.
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Na primeira parte da parcela inicial a Bahia depositou R$ 1,041 bilhão dos precatórios do Fundef a 57 mil profissionais da educação. Depois, mais R$ 69,8 milhões foram distribuídos para 10.247 professores que constam entre os beneficiários, mas estão fora da folha de pagamento por não atuarem mais no Estado.
Após pagamento que finaliza no dia 1º, mais duas serão enviadas para a Bahia pela União em 2023 e 2024. O montante da dívida chega a R$ 1,4 bilhão.
A professora aposentada Maria da Silva, 70, conta que o pagamento dos precatórios é um misto de tristeza e felicidade. “É onde fica a expectativa de pagar o que devo, me livrar de cobradores, pagar empréstimo, mas […] levaram nosso juros e desses 10% não vai chegar nem R$ 1 mil reais para mim”, diz.
Embora tenha passado quase metade da vida em sala de aula, para Maria, os 37 anos como educadora ajudam muito pouco a pagar as contas. Ela hoje recebe R$ 2.050 da aposentadoria e precisa morar com a filha, porque não consegue arcar com os gastos sozinha.
“Meu primeiro emprego foi em 1974 […] e hoje estou dependendo de filhos, coisa que nunca passei na vida. Minha expectativa é que seja cumprida a promessa desse pagamento. Merecemos valor”, declara.
Apesar da espera, as entidades que representam a classe não pretendem judicializar a questão, pois acreditam que o depósito vai acontecer conforme prometido pelo estado. Além disso, Aceb e APLB já carregam processos judiciais devido a outras polêmicas, como o não pagamento dos juros dos precatórios.
A reportagem do CORREIO solicitou posicionamento da Seab mediante às cobranças dos professores sobre os precatórios. A entidade não retornou.
Entenda o caso
Os precatórios do Fundef são valores oriundos de julgamento judicial, no qual a União foi condenada a pagar a complementação das verbas do Fundef que deixaram de ser repassadas pelo Governo Federal para estados e municípios, entre 1998 e 2006, devido a um erro de cálculo.
A conquista dos precatórios é fruto de uma luta da categoria há mais de oito anos, recorda o coordenador-geral da APLB, Rui Oliveira. “Fizemos reunião em 2014, trouxemos banca com advogados e inauguramos processo. Até aquela época diziam que não existia legislação para pagar precatório”.
Foi aprovado, em setembro, durante sessão extraordinária na Assembleia Legislativa do Estado da Bahia (Alba) o Projeto de Lei que regulamenta o pagamento do dinheiro do Fundo de Desenvolvimento da Educação Fundamental (Fundef) para profissionais de educação.
A determinação foi de que a categoria receberá 80% dos precatórios – inicialmente o valor destinado aos professores seria de 60% -, os demais 20% serão encaminhados para melhorias estruturais de escolas no Estado.
Após recebimento da primeira parcela na íntegra, a Aceb diz que ainda precisa resolver embargos da segunda parcela, visto que é preciso nova legislação para transferência do valor restante. A expectativa é adiantar a regulamentação para o débito cair até junho.
São contemplados professores, coordenadores pedagógicos, diretores, vice-diretores e secretários escolares que ocuparam cargo público ou que estavam em emprego público, em efetivo exercício na educação básica da rede pública de ensino, no período de janeiro de 1998 a dezembro de 2006.
Também receberão os precatórios aqueles que ocupavam cargos comissionados do quadro do Magistério e professores contratados pelo Regime Especial de Direito Administrativo (Reda), que atuavam na educação básica no mesmo período.
Estão incluídos servidores ativos e inativos, além de herdeiros daqueles profissionais que se enquadram nos mesmos critérios.
Professores continuam na Justiça para pagamento de juros
Meses após o depósito da primeira fatia dos precatórios do Fundef, entidades que representam os professores seguem em batalha judicial solicitando o valor dos juros sob a dívida pública. Presidente da Aceb, Marinalva Nunes calcula falta em torno de R$ 1 bilhão em torno dos juros. Além de judicializar a questão, ela diz que a instituição protocolou ofício na Procuradoria Geral do Estado (PGE) da Bahia para discutir o valor sem precisar dar continuidade na Justiça. APLB também recorre no Judiciário.
Os educadores alegam que o Estado retirou os juros de mora do cálculo para pagamento da dívida. A presidente da Aceb explica que a categoria já sabia que isso iria acontecer, visto que o Projeto de Lei que regulamenta o pagamento do dinheiro do Fundef foi aprovado sem os juros de mora, mas a classe ainda vai lutar pelo benefício.
A professora Marilene Medeiros, 52, é uma das que se sentiu prejudicada pela exclusão dos juros. Ela esperava receber R$ 50 mil e iria usar o dinheiro para concluir reforma na casa. A mãe de Marilene tem Alzheimer e o plano era construir uma suíte, quarto mais espaçoso e comprar cama hospitalar para a idosa. Porém, a professora recebeu R$ 14 mil e deve receber menos de R$ 1 mil em fevereiro – os 10% restantes.
“Com o que recebi só consegui pagar o cartão [de crédito] e pronto. Estava ansiosa pelos precatórios para conseguir finalizar a construção. Agora comecei a obra mas não terminei porque esse era o valor que teria como fazer”, lamenta.
O coordenador-geral da APLB, Rui Oliveira, reclama que o único estado que não pagou com juros foia Bahia. Ele cita Amazonas, Ceará e Rio Grande do Norte como outras unidades que somaram o rendimento à taxa definida.
Ao CORREIO, a Seab não se manifestou sobre as acusações.
Educadores também cobram pagamento com correção da URV
Outra cobrança da categoria que corre na Justiça é a correção da Unidade Real de Valor (URV). Oliveira, da APLB, comenta que há discussão na PGE-BA para agilização da execução do reajuste e a expectativa é que o governo pague a dívida ainda este ano. Mais de 30 mil funcionários da educação serão beneficiados.
“Entramos na Justiça e ganhamos. Agora está na fase de execução, é preciso apresentar todos os contracheques da época até hoje para que seja feito cálculo. Como ninguém tem contracheque igual é necessário que cada um traga [na APLB] para fazer cálculo individual”, orienta.
A URV trata-se de uma dívida trabalhista desde 1994 criado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso durante a troca de moedas. O coordenador-geral da APLB explica que é necessário reajuste de 10,1% no pagamento da folha dos colaboradores da época, sendo que funcionários do Legislativo e Judiciário já receberam o saldo, com exceção de quem está no Executivo, como os professores da rede pública.
*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo