InícioEditorial"Reafirmar o óbvio": baianas relatam como é ocupar cargos de liderança

“Reafirmar o óbvio”: baianas relatam como é ocupar cargos de liderança

Nadar constantemente contra a maré. Entre mergulhos profundos e forte arrebentação, as mulheres enfrentam verdadeiras correntezas para crescer no mercado de trabalho. A pesquisa mais recente do IBGE sobre o tema indica que na Bahia apenas 36% dos cargos gerenciais eram ocupados por elas, em 2019. Em um país desigual como o Brasil, não basta só força de vontade e determinação. Mas, as baianas retadas mostram que, apesar de todos os percalços, é possível ascender no mundo dos negócios, o que vale a pena ser lembrado neste 8 de Març, Dia Internacional da Mulher.

Luciana Amâncio, 34, ou apenas Lu Amâncio, como prefere, já dava os primeiros sinais de que seria empreendedora na infância. Na casa onde cresceu com os pais em Cajazeiras, começou a dar aulas particulares para a vizinhança e a vender produtos de catálogo. Entrou no curso de Jornalismo com o auxílio do Programa Universidade para Todos (Prouni) aos 17 anos e decidiu trabalhar com comunicação corporativa.

Hoje, administra a própria agência, a ‘Lu Amâncio – Comunicando com Amor’, que tem como foco os negócios inovadores em tecnologia. Ao atender clientes de São Paulo, Lu quebra uma barreira importante para a comunicação baiana. Por aqui, é comum empresas locais contratarem agências de outros estados e não o contrário. 

O perfil empreendedor de Lu Amâncio começou a dar sinais ainda na infância

(Foto: Divulgação/Ane Mazu)

Por trabalhar em um meio majoritariamente branco e masculino, a empresária precisou criar estratégias para driblar os preconceitos, o que não é tarefa fácil. Ela fez, inclusive, consultoria de imagem para descobrir a melhor forma de se posicionar nesse universo. “Para mover a estrutura e mudar o sistema, precisamos nos unir. Meu objetivo é ser uma de um bando e não uma exceção”, diz Lu, que prioriza mulheres negras quando o assunto é trabalho. 

“Não é fácil ser lida como uma mulher que está à frente de um projeto sério. É aquela coisa cansativa de ter que reafirmar o óbvio porque ainda é comum que duvidem da minha capacidade por ser mulher e negra”, desabafa.

Desigualdade
Para as mulheres, em sua maioria, o caminho para a ascensão no mercado de trabalho possui mais entraves. Além de serem atravessadas pelo machismo, o racismo estrutural da sociedade, no caso das negras e indígenas, dificulta o acesso a espaços de poder.

 “Para as mulheres negras e racializadas, as matrizes de opressão que estruturam a sociedade se expressam ainda mais violentas, através do sexismo somado ao racismo e outras formas de discriminação que agridem os direitos das mulheres negras que estão na base da pirâmide social”, diz a cientista política Rebeca Sobra, doutora em Estudos Feministas e de Gênero.

“Por isso, é imprescindível a necessidade de fortalecimento e de ampliação das políticas públicas para as mulheres em todos os âmbitos sociais e participação com paridade entre mulheres e homens nas instâncias de poder, a exemplo das cotas para mulheres nas corridas eleitorais”, complementa.

Ana Batalha é vice-presidente da Associações Brasileira de Cosmetoginecologia (ABCGIN)

(Foto: Divulgação/Ane Mazu)

Apesar de debates sobre desigualdade de gênero crescerem a cada dia, os dados do IBGE apontam que a participação feminina em cargos gerenciais na Bahia diminuiu ao longo dos anos. O pico foi em 2016, quando 45% desses postos eram ocupados por mulheres. Em 2019, último ano da pesquisa, eram 36% dos 102 mil cargos. A média do estado foi a nona mais baixa do país. 

Mesmo quando conseguem ocupar os espaços, elas enfrentam outra dificuldade: a remuneração. Dados do IBGE de agosto do ano passado apontam que enquanto a média salarial dos homens é de R$ 1.728 na Bahia, para as mulheres é de R$ 1.605 – o que indica uma disparidade de R$ 177.

Um novo dispositivo legal deve ser anunciado hoje para garantir a igualdade de salário entre os gêneros. Na segunda-feira passada (1º), a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tabet confirmou que o projeto de lei (PL) seria apresentado pelo governo.

Inovação é com elas
Enquanto meninos são, desde cedo, encorajados a aceitar desafios, meninas costumam ser criticadas quando tomam atitudes inesperadas. No mercado de trabalho, não é diferente. A médica ginecologista Ana Cristina Batalha, 45, enfrentou o machismo e duras críticas de colegas homens quando criou uma técnica inovadora de clitoroplastia – cirurgia para diminuir o tamanho do clitóris – há 15 anos. O procedimento envolve o laser e é menos invasivo do que outras técnicas.

Como médica que cuida de outras mulheres, a inovação só foi possível porque Ana Cristina ouviu suas pacientes. “Um dos efeitos colaterais dos androgênios (hormônios) é o aumento do clitóris e não se tinha o que fazer até então. Uma paciente veio no consultório com o clitóris de 8cm, pediu para amputar e eu neguei”, conta a ginecologista, sobre a primeira cirurgia do tipo que realizou. De lá para cá, foram mais de 300 procedimentos que devolveram a funcionalidade sexual às mulheres atendidas por ela. 

“Quando você é uma pessoa séria e começa a ouvir críticas duras de colegas que admira, dói. Então foi bem pesado no início, mas eu sabia que no futuro eles teriam o trabalho de reconhecer o que criei”, conta.

No ano passado, a médica recebeu o Prêmio de Personalidade Feminina do Ano na área de Medicina, na França, em um evento promovido pelo International Business Institute. 

A segunda franquia da Anna Pegova foi inaugurada em Salvador no ano passado

(Foto: Divulgação)

Lugar de mulher
A frase de efeito “lugar de mulher é onde ela quiser” se popularizou conforme as discussões sobre feminismo se ampliaram nas redes sociais nos últimos anos. A expressão vai de encontro à expectativa de que mulheres são as grandes responsáveis pelo cuidado da casa, do companheiro e dos filhos. 

A empresária Juliana Oliveira, 40, é alvo de questionamentos sobre o seu envolvimento com o trabalho até por parte de familiares. Responsável, junto com a irmã, pelas duas franquias de estética Anna Pegova que existem em Salvador, concilia a gestão do negócio com a criação de duas filhas, de 6 e 10 anos. 

“Minhas filhas veem a mãe sair às 7 da manhã e voltar às 19 horas quase todos os dias, mas eu mostro para elas que eu estou trabalhando para me realizar e não só para ganhar dinheiro”, diz Juliana, que é formada em odontologia, mas estudou estética e gestão empresarial, inclusive com Master in Business Administration (MBA), para tomar a frente dos negócios iniciados pela mãe há 28 anos. 

A segunda franquia da Anna Pegova foi inaugurada em Salvador no ano passado. “Até os próprios familiares questionam se vale a pena eu trabalhar tanto. Se fosse só pelo dinheiro, eu poderia diminuir minha carga horária. Mas existe a realização de fazer o que eu amo e trazer benefícios para tantas outras mulheres”, diz. Enquanto uns criticam, Juliana impulsiona uma rede formada por mulheres e que atende majoritariamente o público feminino.

Lilian Marins é a convidada do Podcast Retadas, que está disponível nas plataformas de áudio

(Foto: Divulgação)

Podcast do CORREIO debate desafios das baianas em cargos de liderança

Como uma das ações para celebrar o Dia Internacional da Mulher, o CORREIO lança mais uma edição do Podcast Retadas, nesta quarta-feira (8). Este ano, o tema é Mulheres que comandam: os desafios das baianas no mundo corporativo. A convidada para o podcast é Lilian Marins, gerente regional da Câmara Americana de Comércio para o Brasil. Lilian é Bacharel em Relações Internacionais com mais de 20 anos de experiência em Gestão e Liderança, além de membro do IOC- Institute of Coaching- Harvard Medical School. 

No bate-papo com Lilian Marins, ela compartilha suas experiências e conta sobre as dificuldades de crescer no mercado de trabalho em uma sociedade marcada pela desigualdade de gênero. “Estamos vivendo um momento de transição muito importante. Uma mulher, quando chegar em um espaço de liderança, precisa abrir espaço e levar outra com ela para que tenhamos exemplos”, afirma. 

O episódio especial do Retadas está disponível em todas as plataformas de áudio, além do site correio24horas.com.br. O podcast teve produção e apresentação feitas pela subeditora do CORREIO, Monique Lôbo, e edição de Vinícius Harfush. Esse é o segundo ano do projeto, que abordou o voto feminino na edição anterior.

Para Renata Correia, diretora do CORREIO, o jornal ‘é sensível aos problemas enfrentados pelas mulheres’ e projetos como o Retadas são prova disso:

“O grande desafio atualmente no ramo da comunicação é acompanhar as transformações pelas quais o negócio passa. O CORREIO dá voz às mulheres, escutamos e acolhemos suas demandas. Aqui no jornal, entre os funcionários, as mulheres também têm voz ativa. Mais de 50% da equipe é formada por mulheres e muitas delas se destacam na liderança”.

*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo.

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